domingo, 27 de setembro de 2009

Entrevista com Valter Lima: 'Paysandu mal ganhou o campeonato paraense. O time estava no limite'

Miguel Oliveira

Repórter de O Estado do Tapajós

O Estado do Tapajós - O Paysandu contratou um novo treinador. O presidente Luiz Omar tinha lhe prometido continuar no clube. O que foi que aconteceu?

Valtinho – Quando eu cheguei à Curuzu o presidente me disse: “Não quero passar para a história como o presidente que botou o Paysandu para a quarta divisão. Eu estou lhe trazendo aqui porque tenho certeza que vamos subir para a segunda divisão”. O Paysandu tinha tido uma temporada muito irregular. Com todo o histórico que era oscilante, esse era o Paysandu que eu recebi. Com oito jogadores entregues ao departamento médico. Nós entramos contra o Águia com o time modificado, ganhamos, perdemos para o Rio Branco e contra o Luverdense marcamos um gol, cedendo o empate. Esse foi o nosso limite de forças. Depois veio o jogo contra o Icasa, em casa, onde perdemos muitos gols e em Juazeiro, o Paysandu mostrou o que era oscilante. Não usaria a expressão falta de qualidade. O fato de o presidente ter confirmado que independente dos resultados eu continuaria, isso foi uma verdade. Nós tínhamos um acordo. Antes dele viajar para São Paulo ele me ligou e quando já veio com o outro treinador ele me disse que nosso acordo estava mantido da mesma maneira. Mas só que futebol você estar perto é uma coisa, você estar longe e outra. Mas cada um paga seu preço pelas suas atitudes. Cada ato exige um preço. O Paysandu para trazer o treinador agora teve um preço a pagar que foi a composição de negócios para que exista uma parceira, com a condição que aceitar uma comissão técnica indicada pelo patrocinador. Isso é normal em outros clubes. Mas o preço que vai ser pago isso, ninguém sabe. O Paysandu hoje não tem comissão técnica, só tem o treinador e um fisiologista que era nossa, da comissão, que é preparador físico.

O Estado – Mas como o senhor se sentiu quando soube que o presidente disse que o senhor não era mais o técnico do Paysandu?

Valtinho – O presidente não disse isso. Eu continuo técnico do Paysandu. Ele não disse. Eu tenho um contrato assinado por ele, que está em vigor. Mas não quero problema. Eu rasgo o contrato. Tudo bem. Mas lembro que quando empatamos com o Sampaio, houve uma festa pelo Paysandu por não ter caído para a quarta divisão, que meu prêmio seria especial. Eu sei da importância que foi ter dirigido o Paysandu em momento tão difícil.

O Estado- O senhor ganhou dinheiro dirigindo o Paysandu?

Valtinho - Do ponto de vista financeiro foi um bom negócio. Por dois meses de trabalho foi bom. No São Raimundo eu ganhava bem, nunca me atrasou salário. Eu iria voltar a ganhar o mesmo salário se fosse dirigir o clube, o que não aconteceu. Quando eu fui pro Paysandu vencia o meu mês e eu abri mão do salário para que o clube pagasse o salário de alguns jogadores. Eu não queria dizer isso, mas foi o que aconteceu.

O Estado - O Zé Augusto reclamou recentemente que a prata de casa do Paysandu fica em segundo plano em questões financeiras. O senhor teve algum problema financeiro com o Paysandu?

Valtinho – Eu não tive problemas com o Paysandu. O Zé Augusto foi um profissional que não reclamava de chuteira, de campo ruim, de nada. Provavelmente o Zé Augusto está reclamando do que pode estar acontecendo agora. No meu tempo não havia problemas financeiro. A única dívida com os jogadores foi a premiação do campeonato que não foi paga. Esta semana surgiu essa polêmica com o presidente dizendo que os jogadores pensavam que o Paysandu era uma Serra Pelada e que entregaram o jogo em Juazeiro por causa de premiação. Existia uma premiação atrasada do campeonato paraense, de 80 mil reais, que ajudei a cobrar para ver se o ambiente melhorava, mas não houve acordo.

O Estado – Muita gente fala que houve boicote dos jogadores ao seu trabalho. Isso é verdade?

Valtinho - Eu diria que não houve boicote. No futebol, quando você perde ou ganha, vão buscar os pormenores para justificar os erros e os acertos. Eu não busco desculpa para as derrotas, não critico arbitragem. Eu entendo que existem falhas, mas eu não reclamo. O que aconteceu é que o Paysandu mal ganhou o campeonato paraense. Era um time oscilante, essa era a realidade. Ao contrário do São Raimundo, que contratou 10 jogadores para a série D, o Paysandu perdeu três jogadores para a série C: Rossini, Alexander e Reinaldo, que era o atacante diferenciado. Por quê? Porque o Edson achava que aquele plantel era suficiente para subir, pois ele pensava que tinha o grupo em torno dele, mas depois que ele não teve mais condições de sustentar o grupo e foi embora, ai a situação era aquela que todo mundo já sabia. Eu fui para lá para tentar fazer um bom trabalho. Eu sei que em termos de conquistas não obtivemos bons resultados. Mas com o grupo de atletas que o Paysandu dispunha naquele momento, o trabalho surtiu efeito para não deixar o time cair. Isso foi uma vitória.

O Estado – Os jogadores fizeram corpo mole contra o Icasa?

Valtinho – Depois do jogo contra o Sampaio eu entendo que houve certo sentimento de dever cumprido. Poxa, não caímos!

O Estado – O presidente falou que os jogadores fizeram corpo mole...

Valtinho – Esse seria um grande momento para o presidente Luiz Omar apontar os nomes desses jogadores, se o que ele disse foi verdade e aí sim, fazer uma reformulação geral. Mas ao contrário, continua com a mesma base de jogadores que está sob suspeição colocada por ele mesmo, se verdadeiras suas afirmações.

O Estado – O presidente alguma vez tentou escalar o time?

Valtinho – Não. Até por que ele declarou em uma entrevista que eu não estava voltando por conta das mudanças que ele esperava que eu fizesse, colocando a base para jogar. Mas eu fiz as mudanças. Troquei o goleiro, dois zagueiros e o lateral-direito, colocando o Cláudio para jogar. Mudar mais já seria improvisar pois estaria tirando o entrosamento da equipe que jogou desde o campeonato paraense.

O Estado- O time estava no ‘bagaço’?

Valtinho. Ai sim. O time estava no limite. Tinha jogadores que não tinham mais o que dar, torcendo para terminar, trabalhar era uma angústia. O Zeziel na penúltima semana ele me procurou dizendo que ele não conseguia dormir direito, tinha pesadelos de tão cansado que estava. O Paysandu jogou 36 jogos, ele jogou 34. Ele não tinha mais forças, não tinha mais o que render, nem motivação. O mesmo aconteceu com o Odivam. Outro detalhe era a média de idade do time. A média de idade era de 32 anos. O Paysandu tinha o Jucimar com 34, o Luciano com 35, o Roni com 33, o Odivam com 36, o Zé Augusto com 36, o Balão com 35 e o Zé Carlos com 34. O que o Paysandu tinha de mais jovial era o meio-campo com Mael e Dada, o Zeziel com 27 e Michel com 27, que tinha acabado de chegar. Isso era muito pouco para compensar esse desgaste e o peso da idade. O Mael e Dada foram os que mais jogaram. Quando eu cheguei na Curuzu esse era o Paysandu.

O Estado – O Paysandu era um time doente e velho?

VAtinho – Eu não diria que era um time velho. Era um time com nível de idade muito alto para se ter todos em um mesmo plantel. A idade não é problema. Hoje você tem jogador em atividade com 42 e 38 anos pelo Brasil. Mas uma coisa é você ter um jogador experiente no time, mas ter oito jogadores no mesmo time é totalmente diferente. Um jogador, como é o caso do Trindade, que tem 38 anos, é diferenciado porque corre como um menino e conhece os atalhos no campo, além de ser um profissional exemplar.

O Estado – O senhor foi acusado de só saber dirigir time pequeno. O que o senhor tem a dizer?

Valtinho – Bem que falaram time e não clube. Eu nunca busquei desculpas para as derrotas. Quem poderia estar dando desculpas era eu, mas eu não fiz isso. Eu já trabalhei no Clube do Remo, o único time que subiu em 2005 para a série B, com o meu trabalho de 5 meses. Infelizmente, o Remo caiu demais nos anos seguintes e hoje está sem série. Eu não fui demitido. Eu pedi para sair. Eu sai porque não foram dadas as condições necessárias para que o time prosseguisse em ascensão. Mas tem um detalhe: se Santarém fosse capital, o São Raimundo seria um time grande? Há um preconceito por causa do futebol do interior. Existe uma rivalidade. No Paysandu eu fui para bater cabeça para escalar time, ao contrário do tempo em que eu dirigi o São Raimundo. Só tive um intervalo de 11 dias para treinar a equipe e recuperar jogadores...

O Estado – Mas a pecha de treinador de time pequeno...

Valtinho – Tem que acabar com essa estória de uma pessoa informar que ouviu que um jogador teria dito que eu sou treinador de time pequeno. Ninguém assume a informação. Tem que acabar com esse papo de que ‘uma fonte disse isso e aquilo’. Que disse que o Edson Gaúcho não era bom treinador, mas tinha o grupo na mão. O ‘grupo na mão que se referem é o efeito masoquista que algumas pessoas de Belém gostam. O bom é aquele que dá porrada, que esculhamba, que grita. No jogo do Flamengo x Clube do Remo, pela Copa do Brasil, o assessor de imprensa do Flamengo botou os repórteres setoristas em fila indiana para fazer as entrevistas com os jogadores do time rubronegro. A coisa mais ridícula do mundo e eles aplaudiram. Eles acham que é dessa maneira que tem que ser. O Edson Gaúcho trancou os portões do gramado da Curuzu e colocou os repórteres circulando entre a torcida. Quando eu cheguei lá na Curuzu eu acabei com isso. Eu coloquei os repórteres para dentro do campo. Mas isso é pouco para eles, eles gostam daquele estilo masoquista, do cara chegar lá, atropelar, esculhambar, porque eles acham que isso é dureza.

O Estado – O senhor guarda alguma mágoa do Paysandu?

Valtinho – Não. A instituição Paysandu nunca estará relacionada a problemas ou conflitos. O que pode divergir, às vezes, são as pessoas que fazem parte do clube. Mas até isso não aconteceu porque meu relacionamento é bom com todos, desde o porteiro, cozinheira, diretoria como um todo.

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