Em 28 de março de 1968, um tiro desferido por um oficial da Polícia Militar no restaurante Calabouço, no Rio de Janeiro, começou a mudar a história do país e a mostrar uma outra face da ditadura militar que governava o Brasil na época. O tiro atingiu o estudante secundarista Edson Luís Lima Souto, paraense, de 18 anos, que já chegou morto à Santa Casa, na Rua da Misericórdia, para onde foi levado. O corpo seguiu para a Assembléia Legislativa do estado, onde foi velado, mas a movimentação estudantil se estendeu para todo o país, inclusive em Brasília, onde centenas de pessoas foram presas. O assassinato de Edson Luís detonou a marcha dos cem mil, ocorrida em 26 de junho de 1968, talvez a maior manifestação contra o regime.
Edson Luís morreu quando os estudantes faziam uma manifestação contra as condições sanitárias do restaurante Calabouço, quando o estabelecimento foi invadido pelos policiais militares, que atiravam a esmo, mesmo diante da ordem ao contrário, dada pelo tenente Alcindo Costa, que comandava o Batalhão Motorizado da PM fluminense.
“Parem de atirar, eu não dei ordem para ninguém atirar”, gritava o oficial. Pouco depois, era ele mesmo que desferiria o tiro que atingiu o estudante. Edson Luís foi levado ao hospital, mas isso não fez com que o ataque terminasse naquele momento. O secundarista morreu, mas outros estudantes ficaram feridos com estilhaços de granadas e bombas de gás lacrimogêneo.
Pobre, Edson Luís deixou o Pará para terminar seus estudos no Rio, para onde iam diversas famílias nortistas na década de 60. Calado, ele não era uma liderança estudantil, como muitas que surgiram na Frente Unida dos Estudantes do Calabouço. Ao contrário disso, era retraído, mas gostava de ajudar os movimentos da época, fosse pregando cartazes pelos muros ou transmitindo recados de colegas.
Edson Luís estudava no Instituto Cooperativo de Ensino, e no dia de sua morte, resolveu jantar mais cedo, já que uma passeata estava programada para mais tarde. Dois feridos O estudante foi atingido com um tiro, que traspassou seu coração, quando caminhava com uma bandeja pelo restaurante, nos momentos em que se iniciou uma correria. Além dele, foram baleados o comerciário Telmo Matos Henrique e o também estudante Benedito Frazão Dutra.
O restaurante Calabouço virou um palco de guerra, com PMs atirando e estudantes respondendo com paus e pedras. Um dia em que o país parou para enfrentar a ditadura. A morte do estudante causou a demissão do general Osvaldo Niemeyer, então superintendente da Polícia Executiva do governador Negrão de Lima. Todas as escolas fecharam no dia seguinte à morte.
O corpo do estudante foi levado ao Cemitério São João Batista por outros estudantes, em um dos cortejos mais emocionantes já ocorridos na cidade. O pátio da Assembléia Legislativa do Rio virou palco de inflamados discursos contra o regime militar, feito por estudantes e políticos, diante do corpo de Edson Luís.
“Cenas de violência tumultuam Brasília”, anunciava o Correio Braziliense em sua manchete do dia 30 de março, um sábado. O jornal fazia referências aos incidentes registrados na Universidade de Brasília (UnB), onde estudantes enfrentaram a polícia e o Corpo de Bombeiros, que tentavam dissipar a manifestação com jatos de água.
A Comissão dos Mortos e Desaparecidos Políticos conseguiu uma pensão para a mãe do estudante, Maria Souto Rocha, que ainda mora em Belém. Hoje, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, Prefeitura do Rio, União Nacional dos Estudantes (Une) e União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) inauguram uma estátua do estudante morto, no centro da capital fluminense.
(Correio Braziliense)
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