Lúcio Flávio Pinto
Articulista de O Estado do Tapajós e editor do Jornal Pessoal
Como pode haver renovação de lideranças políticas no Pará se os partidos se tornaram propriedade privada dos que o comandam? A pergunta conduz a uma das chaves para elucidar a crise de representação política no Estado: a concentração de poder e o uso dos partidos como extensão de famílias, que se expandem no exercício de cargos eletivos, desestimulam quem tenta se iniciar na carreira política, mas não faz parte de igrejinhas ou de "panelinhas".
Um político que consegue chegar ao topo do poder arrasta logo em seguida filhos, parentes e aderentes, como se essa corrente fosse normal e até desejável. É um fenômeno nacional, como se vê pela dobradinha Edson Lobão, no Ministério das Minas e Energia, e Lobinho, o filho, na vaga deixada temporariamente no Senado pelo pai, ao passar a ocupar cargo no executivo federal. Esse nepotismo sempre houve no Brasil, país praticante de maus hábitos republicanos, mas o que era exceção está se tornando regra.
Outro dia um jornal publicou que o deputado Lira Maia, do DEM, aceitaria uma composição com o PMDB com o PT para a sucessão da prefeita Maria do Carmo, em Santarém, desde que seu sobrinho fosse o companheiro de chapa. Não sei quem é o sobrinho[vereador Erasmo Maia] do parlamentar, se possui ou não vocação política, demonstrada, mesmo que de forma embrionária, na vida que já viveu até aqui. Mas essa condição, que seria fundamental, deixa de existir porque estão em plena vigência dois ditados, dentre muitos outros ditados aplicados à espécie: "farinha pouca, meu pirão primeiro" e "Mateus, primeiro os teus".
Citei o caso do deputado santareno porque foi o mais recente de que tive notícia. Mas quantos podemos citar de memória? Convido o distinto leitor a mandar para este jornal os nomes de parentes que se desdobram em cargos políticos no Estado para fazermos um rol - o mais completo possível - do nepotismo no Pará. Publicarei a lista na próxima edição, se ela for realmente expressiva.
Quem não rezar pela cartilha do dono do partido, do controlador do curral eleitoral ou do detentor do cargo público (elegível ou não), estará fora da missa. Entrar e prosseguir na política exige como condição prévia sujeição a essa nobiliarquia de araque, ao mando do chefe, primeiro e único, como um Momo fora de época. Quem aceitar essas condicionantes estará se sujeitando de pronto a ser figura decorativa ou abrir mão de princípios. Daí a política se tornar cada vez menos representativa e menos expressiva, um autêntico jogo de cartas marcadas e de desempenho medíocre.
Quem quiser tirar a prova dos nove deve ir assistir a uma sessão do legislativo. É espetáculo sem atrativo, de retórica fraca e idéias curtas. Com um guia ao lado, logo se saberá que aquele parlamentar na tribuna defende causa própria, pois é, ao mesmo tempo, representante e representado, em virtude da sua condição de político e empresário. O outro deblatera em defesa da própria família, que se desdobra em todos os galhos do poder no município tal. Aquele outro defende determinado contrato ou convênio porque vai favorecer a empresa, que é sua, embora dela licenciado.
A res pública dos romanos, construtores dos alicerces sobre os quais ainda se assenta a nossa organização política, se tornou negócio privado, assunto familiar, tema corporativo. Com essa bitola, o mundo da política deixou de ser a projeção da sociedade para viver em uma bolha artificial, exposta ao risco de estourar quando submetida a uma crise. O cidadão comum, nessas ocasiões, se choca com o espetáculo das vísceras éticas e morais que são expostas. A política prossegue, mas contaminada por dentro por um vírus, a falta de credibilidade, que pode matá-la, com efeitos desastrosos sobre todos.
O que fazer? Certamente, continuar a tentar desfazer a quadratura desse círculo vicioso.
Um comentário:
Jader Barbalho, Joércio Barbalho, Luis Guilherme Barbalho, Elcione Barbalho,Helder Barbalho e José Priante, Isane Monteiro. Relação da família do Jader que pretendeu , exerce ou já exerceu cargo legislativo.Não vou nem falar nos cargos executivos, porque a lista seria muito extensa, por demais.
Não sei se temos um exemplo mais "dignificante" dessa política, como bem disse o criterioso jornalista Lúcio Flávio Pinto.
Uma pena que ele não tenha se atentado, ou mesmo se lembrado, para esse exemplo tão expressivo.
Mas como ele sugere que se mande a relação, aí vai a minha. Mas, quem sabe, não aparece uma outra maior. E pior. Em todo caso, eu duvideodó.
João Augusto
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