Obras públicas em Santarém
O prefeito, Santino Sirotheau Corrêa, respondendo aos seus críticos, garantia, em 1952, que estava cumprindo todas as suas promessas de campanha eleitoral. "Como atestado vivo e eloqüente de sua proficiência administrativa", O Jornal de Santarém, que era o órgão oficial do seu partido, o PSD (Partido Social Democrático, que desapareceria depois do golpe militar de 1964), enumerava o que realizara até então.
O rol dessas obras serve de medida sobre a noção que os administradores públicos tinham então de suas obrigações e a dimensão das expectativas da própria população em relação aos seus representantes no exercício do poder político.
Estas eram as realizações da prefeitura de Santarém enumeradas pelo jornal:
"lá está em Pinhel uma Escola Rural; uma ponte no povoado Andarú; uma cerca no cemitério de Boim; um prédio de alvenaria e cobertura de telha para usina de luz e posto fiscal, já em início de construção, em Alter do Chão, que terá luz elétrica dentro de pouco tempo; uma escola rural em Aritapera, toda de madeira real e cobertura de alumínio; uma escola rural em Barreira do Tapará, em alvenaria; piso cimentado e cobertura de alumínio; conclusão do cais de arrimo do povoado de Aritapera; continuação do cais de arrimo na vila de Curuai; construção de uma escola que ligará a vila de Curuai ao rio Arapiuns, já indo em cerca de 10 quilômetros a extensão dessa estrada; pavimentação de piçarra de um grande trecho da estrada de Urumarí, com a construção de dois pontilhões e abertura dos leitos dos igarapés adjacentes; uma escola na colônia Jacamin, em madeira real, piso de cimento e cobertura de cavaco; construção de uma idêntica escola na colônia Jacamin; idem em Maraú; construtção da ponte do Irurá; construção da ponte São Braz, na colônia Igarapé Açú; um sem número de serviços de limpeza, roçagem e conservação das estradas municipais, e grande número de realizações que tornaria até fastidioso mencioná-las".
Represália política?
Através do seu jornal, o prefeito também desmentiu que tivesse exigido de Antônio Pinho a demissão de empregados de sua empresa, a Alto-Falantes Ypiranga, sob pena de mandar fechá-la. Seria a punição por esses empregados terem cedido os microfones da emissora ao "operário" Benedito Monteiro, "a fim de que o mesmo fizesse propaganda de fundo comunista e de caráter subversivo e insuflacionário, com ataques à autoridade constituída e incentivo à mazorca e à desordem".
Pelo contrário: Terezinha Boa Morte, referida na denúncia dos adversários do prefeito como uma das pessoas punidas, foi por ele admitida como funcionária do PSD, "com o mesmo ordenado que percebia na Empresa Ypiranga e com o exercício na sede da agremiação de Magalhães Barata em Santarém".
Se, quanto aos demais, o dono do serviço de alto-falantes os tivesse realmente mandado para rua, isso tinha a ver com seu "foro íntimo" e não com o prefeito.
Contas municipais em 1952
O orçamento de Santarém nesse ano foi de 5,6 milhões de cruzeiros, com mais Cr$ 180 mil de despesa extra-orçamentária.
As principais despesas de custeio da prefeitura, depois do funcionalismo, eram com a usina de eletricidade (Cr$ 435 mil), o abastecimento de água (Cr$ 214 mil), a limpeza pública (Cr$ 199 mil) e a garagem municipal (Cr$ 133 mil)
As despesas com o subsídio e a representação do prefeito e do seu substituto (Cr$ 61 mil) equivaliam a metade do gasto com a Câmara Municipal (Cr$ 128 mil). A folha de pessoal ativo era de Cr$ 653 mil e a de inativos, Cr$ 52 mil.
O salário da estiva do trapiche importava em Cr$ 143 mil, que correspondia a metade de tudo que era gasto com a instrução pública (Cr$ 280 mil). Para a saúde pública foram destinados apenas Cr$ 64 mil, para o pagamento de dois enfermeiros e manutenções de dois subpostos, nas vilas de Aveiro e Boim, além da compra de medicamentos.
Era bem menos do que os Cr$ 98 mil da assistência policial (pagamento do destacamento local e gratificações ao delegado, comissário, escrivão e dois agentes de polícia). Os Cr$ 51 mil da assistência social foram para auxílios diversos a indigentes e presos pobres, à maternidade e infância desvalidas, contribuições à Legião Brasileira de Assistência, asilos, orfanatos e instituições sócio-penais.
A fiscalização municipal absorveu Cr$ 139 mil, correspondendo a percentual sobre a arrecadação efetuada.
Com a gratificação ao advogado, inclusive pagamento de percentual sobre as cobranças efetuadas, a prefeitura gastou Cr$ 15 mil. (o seguro da usina de luz consumia menos de 10 mil).
Já CR$ 97 mil foram da taxa da Associação Comercial do Baixo Amazonas.
"Auxílio ao Jornal de Santarém", órgão oficial do PSD, o partido do prefeito, aparecia na rubrica "subvenções, contribuições e auxílios diversos", no montante de quase CR$ 52 mil.
A administração municipal pagou 40 mil pela desapropriação do terreno doado à Cia. de Fiação e Tecelagem de Juta de Santarém.
Mais Cr$ 163 mil pela subscrição de cotas da Empresa Telefônica de Santarém.
Em 1952 a prefeitura de Santarém pagou 150 mil cruzeiros à Servix Engenharia Limitada, "por conta dos estudos para aproveitamento do potencial hidráulico da Cachoeira do Palhão" (atual hidrelétrica de Curuá-Una). Para se ter uma idéia da ordem de grandeza desses números, dois caminhões Studebaker comprados pela prefeitura no mesmo ano custaram Cr$ 174 mil. A aquisição de gado para abastecimento público nos meses de janeiro, fevereiro e março consumiu Cr$ 155 mil.
Em 1941 a prefeitura tomou emprestado um milhão de cruzeiros da Caixa Econômica Federal, no Rio de Janeiro, para pagar em 15 anos, com juros contratuais de 8% ao ano, que somariam Cr$ 720 mil no período. Até 1951 a prefeitura já pagara Cr$ 802 mil, com saldo devedor de Cr$ 917 mil. A amortização da dívida pública e pagamento de juros somaram Cr$ 114 mil.
Modo autoritário
Um aviso da prefeitura à população da cidade no final de dezembro de 1952, revelava a maneira autoritária e draconiana no exercício da função pública na época, mas também a gravidade do problema da energia:
"O Sr. Secretário Municipal, respondendo pelo expediente desta Comuna, faz ciente aos Srs. Consumidores de corrente elétrica que, em virtude de ter sido constatado pelos fiscais, o uso irregular de lâmpadas de 120 voltas [volts] e outros aparelhos elétricos, bem como o aumento de velas que excedem de muito a quantidade registrada no Serviço de Luz, determinará dentro de breves dias uma severa fiscalização nas residências e casas comerciais, com o objetivo de coibir as infrações que ora estão se verificando.
Aos infratores flagrados serão aplicadas as multas previstas em lei, além de terem sua ligação cortada imediatamente".
Meses antes, uma matéria em O Jornal de Santarém registrava um "uso imoderado e abusivo em grande número de casas residenciais de lâmpadas para 120 volts, que sobrecarrega a usina em detrimento dos que usam honestamente lâmpadas de 220". Já instalações deficientes e estragadas provocavam constantes curtos circuitos, "com escapamento e conseqüente desperdício de energia".
Luz: um flagelo
No dia 10 de julho de 1953 Santarém ficou completamente às escuras. O motor de luz da Usina Municipal de Eletricidade estourou: duas bobinas quebraram e um alternador fundiu. Foi o maior acidente sofrido pelo sistema de abastecimento de energia da cidade. A causa foi o excesso de carga da demanda de energia da população.
Enquanto fazia os reparos na velha máquina, a prefeitura importava de Belém um motor HMG, com capacidade para 205 KVA, e anunciava que abriria concorrência pública para a compra de um outro "grande motor", de 240 KVA, "cuja instalação será a solução definitiva do problema, colocando a nossa população em situação privilegiada entre as muitas cidades e capitais que hoje estão se debatendo na angústia e no desconforto da carência de energia elétrica".
Não foi exatamente assim.
Nenhum comentário:
Postar um comentário