Lúcio Flávio Pinto
Editor do Jornal Pessoal e Articulista de O Estado do Tapajós
Era para o nepotismo ter acabado no judiciário do Pará em fevereiro de 2006, quando foram demitidos os parentes dos magistrados até o terceiro grau, conforme determinação do Conselho Nacional de Justiça. Em maio do mesmo ano foi adotada uma nova medida contra a persistência dessa prática: o ponto eletrônico com identificação digital. Os parentes que continuavam a trabalhar nos gabinetes tiveram que ser finalmente afastados.
Fim de vez da ação entre amigos que havia na justiça? Não, segundo fontes bem informadas sobre o poder. Funcionários que atuam em vários gabinetes de desembargadores passaram a repassar a parte maior dos seus vencimentos para os parentes que foram afastados dos seus cargos. Cada gabinete tem quatro funcionários de livre nomeação, por serem de confiança: um coordenador, dois assessores de câmara (agora com outra designação, mas desempenhando a mesma função) e um assistente. Os três primeiros, bacharéis em direito, recebem aproximadamente 5,8 mil reais por mês (o quarto, do qual não é exigido curso superior, R$ 1,5 mil).
Feitos os descontos, o maior sendo de imposto de renda (quase R$ 1 mil), sobram R$ 4,4 mil líquidos. Segundo a denúncia, uma quarta – ou uma terça – parte fica com o funcionário e a parcela maior é repassada ao parente demitido, que não aparece no serviço na maioria dos casos. Mas ainda haveria aqueles que continuam a ocupar os gabinetes, embora já sem qualquer vínculo oficial com o judiciário. A anomalia é visível diariamente no palácio da avenida Almirante Barroso.
Essa prática não chega ao gabinete da presidente do tribunal, segundo as informações fornecidas pelas fontes, que procuraram este jornal por causa da matéria de capa da edição anterior, sobre o nepotismo na política paraense, nem há qualquer suspeita sobre boa parte dos demais desembargadores do TJE.
Espera-se que o tribunal apure a denúncia, que é grave. Se for confirmada, repete-se no judiciário uma prática espúria já detectada e comprovada no âmbito do poder legislativo: assessores parlamentares repassam (ou repassavam) parte dos seus salários aos próprios deputados em cujos gabinetes estão (ou estavam) lotados, a pretexto de contribuir para a verba de representação. Agora seria pior: o dinheiro acabaria nos bolsos de parentes.
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