O alto e os baixos
Lúcio Flávio Pinto
Nagib Charone é um dos poucos acadêmicos que se expõe ao debate público em Belém. Uma vez por semana ele enfrenta o desafio de um tema de interesse imediato com um artigo em O Liberal. Nem sempre concordo com o que ele diz, mas aprendo tanto na divergência quanto na afinidade. Sua última manifestação é sobre tema relacionado a uma nota publicada na edição anterior deste jornal. Não há motivo para pânico nem para pressa, mas é preciso estudar melhor o subsolo no sítio de Belém, que está sendo submetido a uma pressão que ninguém, baseado no processo histórico da cidade e no bom senso, podia prever.
Quem constrói seu espigão faz sondagem no terreno do seu estrito interesse. O que acontecerá ao redor e mais além não é alcançado por essa abordagem, marcadamente comercial, mesmo quando respaldada na melhor ciência e na mais moderna técnica. A tarefa cabe ao poder público, que, prevenindo-se desde logo, devia inibir – e não fomentar desbragadamente, como está fazendo – a hipertrofia do crescimento vertical na capital paraense.
Quando Jerzy Lepecki encomendou o projeto de uma usina térmica nuclear para enfrentar a carência de energia em Belém no final da década de 60, essa alternativa foi descartada porque o terreno não oferecia segurança para absorver a vibração gerada pelo funcionamento dessa termelétrica. Quem é vizinho do jornal O Liberal sente quando a possante rotativa entra em ação, mesmo com os cuidados tomados na construção do piso especial para a máquina. Numa padaria perto das torres gêmeas que a Village está levantando (tema da nota do JP), sente-se quando um veículo mais pesado passa na rua. Não sei se as rachaduras cada vez mais visíveis em uma das paredes do estabelecimento têm a ver com essa influência. Mas é impossível não fazer associação imediata com a imagem que define o subsolo do terreno: um colchão de lama.
A prefeitura podia se unir à Universidade Federal do Pará para um levantamento amplo sobre a estrutura do subsolo e os efeitos que ele já deve estar sofrendo pelo adensamento dos grandes prédios erguidos na cidade, um cada vez mais próximo do outro, e cada vez mais altos. As observações feitas por Nagib Charone, ponderadas e equilibradas, dão o tom da necessidade desse trabalho, que, não tendo precedido as construções, precisa, agora, mediar sua expansão. E, talvez, interromper seu fluxo exagerado. Mesmo que os construtores de espigões adotem a tática do silêncio ou do barulho alugado, promocional.
Um comentário:
Moro há 39 anos no Recife, mas sou belenense. Vou algumas vezes em Belém e me surpreendo com a aceleração imobiliária. Certamente daqui para 2018, esta cidade ficará inabitável, pois o sub-solo será afetado e a temperatura chegará a niveis alarmantes.
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