terça-feira, 27 de maio de 2008

Falta energia para verticalização da produção mineral no oeste do Pará

Paulo Leandro Leal
EcoAmazônia

A região Oeste do Pará vive atualmente um boom em empreendimentos minerais, recebendo investimentos que somam mais de R$ 2 bilhões. O principal minério explorado na região é a bauxita - matéria prima do alumínio -, sendo que em 2009 a produção deve ultrapassar 20 milhões de toneladas. Com as pesquisas que estão sendo realizadas e os novos investimentos previstos, a produção deve ultrapassar 30 milhões de toneladas em 10 anos. No entanto, todo este minério sai da região na forma bruta, semi-processado, sem qualquer industrialização. A verticalização tem sido cobrada por entidades do setor produtivo, lideranças e movimentos sociais.
Mas com toda esta produção, o que impede que o minério retirado nas enormes jazidas seja transformado em alumínio na própria região? Júlio Sanna, presidente da Mineração Rio do Norte, a maior produtora de bauxita do Brasil, tem uma resposta curta e objetiva: falta energia elétrica em quantidade e qualidade para a industrialização. O executivo participou, no meio da semana, de uma reunião com empresários na sede da Associação Comercial e Empresarial de Santarém (ACES), onde foi questionado sobre a verticalização da produção. "O maior entrave ainda é a falta de energia", disse, explicando que a industrialização é um processo eletro-intensivo que requer energia atualmente sem disponibilidade na região.
Júlio informou que no caso da MRN, que explora há três décadas uma jazida de bauxita no Rio trombetas, em Oriximiná, a energia é toda produzida pela própria empresa, através de grupos geradores. A região onde está localizado o projeto, a Calha Norte do Rio Amazonas, não é servida com energia da hidrelétrica de Tucuruí. A única fonte geradora são usinas tocadas a diesel. Segundo Júlio Sanna, é impossível fazer um planejamento de investimento em verticalização sem que haja o fornecimento de energia, pois as usinas a diesel não conseguem gerar a quantidade necessária para o processo industrial e, além disso, este processo de geração é muito caro.
A diretoria da ACES questionou porque então não se planeja uma estrutura de verticalização na margem direita do Rio Amazonas, em Santarém, por exemplo, que recebe energia de Tucuruí. O presidente da MRN explicou que os investimentos em verticalização são muito altos e foram planejados levando em conta que a região não possuía energia. "Além disso, pelas informações que eu tenho, a energia que chega aqui não tem condições de tocar um projeto deste", destacou Júlio Sanna.
O executivo não vê no curto prazo a possibilidade da verticalização mineral no oeste do Pará, principalmente pelos investimentos já feitos nas plantas de industrialização existentes, no Pará e no Maranhão. No entanto, ele acredita que é possível desenvolver a região a partir da atividade mineral. "Países que são grandes produtores primários, como o Chile e o Canadá, conseguiram obter um extraordinário desenvolvimento", comparou, destacando que é preciso aproveitar a presença destes grandes empreendimentos minerais na região para se buscar alternativas de desenvolvimento econômico e social.
PRODUÇÃO
A MRN produziu, no ano passado, 18 milhões de toneladas de bauxita, mesma produção prevista para este ano. O minério é retirado dos platôs (minas), levado para uma área onde é britado e depois passa por um processo de lavagem. Na seqüência é transportado em vagões até o porto, onde é colocado em navios e transportado por mais de mil quilômetros pelos rios Trombetas e Amazonas, até o porto de Vila do Conde, de onde é conduzida até a Alunorte, em Barcarena. Somente lá é que acontece a industrialização, com a transformação de alumina (uma espécie de farinha de alumínio) e os lingotes, que são exportados.
Energia é fator limitante em novos projetos
A falta de energia elétrica na região é um fator que limita os novos investimentos no setor mineral. Em Juruti, no extremo Oeste, a mineradora Alcoa está implantando um projeto de mineração de bauxita, com investimentos na ordem de R$ 1,7 bilhão. No próximo ano, a empresa já deverá produzir as primeiras toneladas de bauxita, mas novamente, o minério sairá da região na forma bruta. A industrialização vai acontecer na Alunorte, no Maranhão, que recentemente teve a sua capacidade ampliada para poder beneficiar o minério retirado no Pará.
Maldade da empresa? Não exatamente. O problema é puramente logístico. Sem energia, não há como verticalizar a produção. Recentemente, o presidente da Alcoa para a América Latina e Caribe, Franklin Feder, também foi questionado em Juruti sobre o porquê de não verticalizar a produção na própria região. Ele disse que existe interesse de instalar uma refinaria de alumina e até mesmo uma fábrica de alumínio na região, mas que o investimento depende de uma grande quantidade de energia só disponível com a construção da hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu. Sem este empreendimento, garante Feder, não há como verticalizar a produção no oeste do Estado.
Além da MRN e da Alcoa, a região poderá receber outro grande empreendimento mineral. A empresa Rio Tinto Alcan encontrou o que pode ser a maior reserva de bauxita do mundo, entre os municípios de Monte Alegre e Alenquer, também na Calha Norte, com potencial para, pelo menos, quatro bilhões de toneladas. A empresa evita criar expectativa em torno do projeto, afirmando que está somente na fase de pesquisa, mas prevê investimentos de até R$ 4 bilhões, caso se confirme a viabilidade da exploração.
O empreendimento que a Rio Tinto pretende fazer no Baixo Amazonas poder gerar mais de dois mil empregos diretos e mais 15 mil indiretos. Isso com a implantação da refinaria que transforma a bauxita em alumina e com uma produção média de 10 milhões de toneladas de bauxita por ano e 2,5 milhões de toneladas de alumina. O projeto inclui a construção de um mineroduto para transportar a bauxita até próximo ao Rio Amazonas, onde seria transformada em alumina e embarcada em um porto construído pela empresa. Mas para tocar a refinaria seria necessário o fornecimento de grande volume de energia, que não existe na região.
A margem esquerda do Rio Amazonas, a chamada Calha Norte, justamente onde foram encontradas as maiores jazidas de bauxita da Amazônia, é completamente desprovida de energia elétrica firme e de qualidade. As cidades são abastecidas por usinas dieselétricas que não produzem energia suficiente sequer para o consumo doméstico. O racionamento é comum e não existe energia suficiente nem mesmo para pequenos empreendimentos, que dirá para tocar uma refinaria de alumina ou uma fábrica de alumínio.
O problema da Calha Norte é pior porque a região tenta, em vão, há décadas, convencer o governo a levar a energia da hidrelétrica de Tucuruí para a região. Isso só seria possível com a transposição do Linhão de Tucuruí para a região, atravessando o Rio Amazonas. Existem dois projetos prontos, mas faltam os recursos do governo federal. As mineradoras que atuam na região jê demonstraram interessem em colaborar financeiramente com o projeto.
A corrida mineral que se iniciou recentemente no Baixo Amazonas coloca em xeque a política energética adotada há décadas para a região, que não recebeu investimentos maciços em geração e, principalmente, transmissão de energia elétrica. A desculpa é que não havia demanda que justificasse o alto investimento. A exceção foi a construção do Linhão de Tucuruí, o Tramoeste, que levou energia para a região da Transamazônica, abrangendo os municípios de Santarém e Itaituba.
A recente política energética do governo federal também está em xeque. A construção da hidrelétrica de Belo Monte é uma promessa não cumprida no primeiro mandato do presidente Luís Inácio Lula da Silva. Neste segundo mandato, o governo incluiu a obra no Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), mas ainda não se tem notícia da liberação de recursos para o início da obra. Sem a hidrelétrica, estará inviabilizada qualquer perspectiva de se construir um super-pólo de alumínio no oeste do Pará.

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