sábado, 12 de julho de 2008

CONCORRÊNCIA DE R$ 40 MILHÕES FOI DE CARTAS MARCADAS

Miguel Oliveira
Repórter

O processo de licitação de obras públicas foi criado com o objetivo de dar mais transparência aos gastos públicos e permitir que todas as empresas possam concorrer a estas obras. Mas em Santarém, no oeste do Pará, uma licitação cujo valor das obras ultrapassou dos R$ 40 milhões não passou de uma encenação, pois se sabia antes quem venceria a concorrência. A empresa Santarém Engenharia Ltda. (Saneng) abocanhou uma obra de R$ 40,6 milhões em uma licitação de fachada, conforme atestam documentos públicos obtidos com exclusividade pela reportagem de O Estado do Tapajós, que publicou o resultado cifrado antes mesmo da abertura das propostas que a empresa santarena seria vencedora.
Os documentos em poder da reportagem mostram que a Concorrência Pública 002/2008, cujo objeto é a execução de serviços de pavimentação de ruas em Santarém, foi realizada pela Comissão Permanente de Licitação (CPL) para dar as obras à Saneng. Um dos indícios mais claros é absoluta falta de concorrência para uma obra de valores tão vultuosos. A única concorrente da Saneng foi a construtora Mauá Júnior Ltda. de Belém, que segundo a própria ata de abertura de propostas, não demonstrou nenhum interesse de concorrer de fato e não enviando à abertura dos envelopes nem sequer um representante legal munido de procuração.
A abertura dos envelopes da licitação de cartas marcadas começou no dia 30 de junho, mas foi interrompida depois que um vereador da oposição entrou no local. O presidente da Comissão Permanente de Licitação, Gilson Valério de Oliveira, disse que a suspensão ocorreu para uma melhor análise dos documentos. Uma nova reunião ocorreu no dia 03 de julho e, conforme a ata assinada pelos presentes, a Saneng apresentou uma proposta de R$ 40.633.299,84. Já a empresa Mauá Júnior apresentou uma proposta de R$ 41.032.375,97, cerca de 400 mil a mais. A CPL declarou então que a Saneng foi a vencedora do processo licitatório.
Mas o que parece ser um procedimento legal esconde detalhes que mostram uma licitação de fachada, cujo resultado já estava determinado previamente. Como se não bastasse a estranha falta de interesse das inúmeras construtoras por uma obra de R$ 40 milhões, a única concorrente da Saneng demonstrou participar do processo apenas para cumprir tabela, ou seja, para dar ares de legalidade ao procedimento. A Construtora Mauá Júnior enviou para a reunião da CPL a senhora Cristiane Lameira Vasconcellos, mas ela chegou à reunião sem uma procuração que a designasse representante da empresa. A "representante" da empresa não chegou a ser credenciada pela CPL, não teve direito a voz na sessão e não pode nem mesmo assinar a ata. Na prática, foi uma licitação de uma empresa só, a Saneng.

Jornal publicou resultado antes da licitação

A prova mais inconteste de que a licitação realizada pela prefeitura é que o resultado da mesma foi publicado com antecedência por O Estado do Tapajós. Na edição de 18 a 20 de junho, página 06, o jornal publicou uma nota cifrada que mostra que a Saneng seria a vencedora da licitação, o que de fato se consumou depois da abertura dos envelopes. O resultado era previsível porque a empresa vem ganhando seguidas licitações na prefeitura de Santarém, apontando para um óbvio esquema de favorecimento.
A nota publicada em junho temo título de "sorteio de aniversário", e enumera três prêmios, com um número de bilhete cada um e um código. O terceiro prêmio tem o bilhete número 20083006 e o código maic. O número do bilhete trata-se, na verdade, da data da licitação, 30 de junho de 2006. O código é, de trás para frente, o local onde seria realizada, no Centro de Informações Ambientais (Ciam). Ainda de acordo com a nota publicada no jornal, o segundo prêmio informa na verdade a data em que o aviso de licitação foi publicado no Diário Oficial do Estado, em 25 de maio de 2008, e o nome da CPL, Gilson. Por isso foi colocado o "bilhete" de número 05282008 e o código noslig, que é Gilson de trás para frente.
A informação mais importante na nota é o fictício "primeiro prêmio", que diz que a Saneng seria a campeã do processo de concorrência pública. O bilhete mencionado pelo jornal é, na verdade, o número da concorrência, que é 002/2008 e o código gnenas nada mais é que o nome Saneng, de trás para frente. A publicação da vencedora da licitação antes mesmo que os envelopes fossem abertos demonstra o quanto podem ter sido de cartas marcadas as licitações realizadas pela prefeitura, esta em especial.
Não foi somente O Estado do Tapajós que publicou o resultado com antecedência, através de notas cifradas. No dia 21 de junho, o jornal Tribuna do Tapajós publicou, na página 27, um anúncio que dizia: "A PMC comunica que depois de analisados os processos CP 002 e 003, dará dias 30 e 04 o prêmio à gnenas pelas relevantes contribuições dadas ao TP. PG. PD". Na verdade, o anúncio quer dizer que a prefeita vai dar a licitação 002 para a Saneng pelas contribuições prestadas ao PT, ao presidente da CPL, Pedro Gilson e ao secretário municipal de Infra-estrutura, Peterson Diniz.
Ao publicar estas informações cifradas, o jornal O Estado do Tapajós quis mostrar que a licitação realizada era mesmo de cartas marcadas, com todos sabendo quem iria ganhar, já que o jornal não possui nenhum poder de adivinhação e muito menos tem condições de prever o futuro. Prova disso é que o jornal O Impacto também publicou, sem querer, o resultado da licitação. No dia 13 de junho, a coluna Top Amazônia, na página 27, publicou uma charge que diz: "A SANENG informa que vai adotar, a partir do final do mês, todos os buracos". A nota, assinada pelo colunista Eduardo Dourado, é uma demonstração clara de que já era de conhecimento público que a Saneng venceria a licitação para pavimentar as ruas da cidade.

Empresário denunciou na Polícia dificuldade de obter edital

As empresas que não estavam no esquema das cartas marcadas e que tentaram participar da licitação não conseguiram acesso ao edital de concorrência. O empresário Elson Pinheiro Silva, da empresa Silva Júnior Ltda, chegou a registrar um Boletim de Ocorrência na Delegacia de Polícia Civil de Santarém, denunciando que não conseguiu acesso ao Edital de Licitação das concorrências 002 e 003, de serviços de asfaltamento. A empresa tentou de todas as formas obter os editais, mas não conseguiu.
Segundo o BO registrado no dia 27 de junho, o empresário disse à polícia que desde o dia 19 tentou junto à Seminf obter os editais para que pudesse participar da concorrência pública, mas não obteve sucesso. A empresa avalia que foi excluída do processo antes mesmo e ter acesso as regras do mesmo. O empresário disse que não encontrou na Seminf nenhum membro da comissão de licitação que lhe explicasse os motivos da não disponibilidade do edital.
No dia 25 de junho, a empresa Silva Júnior Ltda. chegou a enviar um ofício ao presidente da Comissão Permanente de Licitação, Pedro Gilson, informando as dificuldades para conseguir os editais das licitações e solicitando que o mesmo permitisse, em até 24 horas, a venda dos referidos editais, para que a empresa pudesse participar da licitação. Sem obter resposta e como não conseguiu acesso aos documentos solicitados, a Silva Júnior Ltda, não pode concorrer no processo que sagrou a Saneng vencedora.

Saneng não se pronuncia sobre a licitação

A reportagem de O Estado do Tapajós tentou, na sexta-feira, encontrar o sócio-diretor da Sanneg Carlos Eduardo Mendonça mas, no escritório da empresa o mesmo não se encontrava e nem retornou os telefonemas anotados por sua secretária de prenome Ana.
A primeira tentativa de contato ocorreu às 11h43. A secretária informou que Eduardo não se encontrava na sede da empresa e solicitou que novo contato fosse feito à tarde. Às 16h36 nova ligação foi feita à Saneng para marcar uma entrevista com o diretor, mas Ana informou que Eduardo acabara de sair e se recusou pela segunda vez a fornecer o número do aparelho celular do mesmo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Quanta vergonha! Quanta palhaçada! Este grupo de políticos só pensa no favorecimento ilícito próprio! Quero ver o que vão dizer os blogueiros e articuladores que arrotam honestidade o qual são sustentados por propinas oriundas de processos fraudulentos. Sabe o que? NADAAAAAAAAAA! VERGONHA!