domingo, 7 de setembro de 2008

Max Martins: o poeta maior

Lúcio Flávio Pinto
Editor do Jornal Pessoal e articulista de O Estado do Tapajós

Max Martins é o maior poeta paraense. Chega-se a essa conclusão ao final da leitura dos Poemas Reunidos (1952-2001), reeditados em versão atualizada em 2001 pela Universidade Federal do Pará. Na apresentação, escrita 10 anos antes, para a primeira edição, Benedito Nunes inclui Max entre os “poetas-camaleões” do inglês Keats. Pura verdade: em 1952, quando publicou seu primeiro livro, O Estranho, Max era, na essência, um parnasiano-simbolista, que só tomou contato com a revolução modernista brasileira com atraso de duas décadas em relação à Semana de Arte Moderna, realizada em 1922, em São Paulo.
Num percurso de meio século como lapidador de palavras dotadas de significado simbólico, Max transmudou-se e reinventou-se. Sempre pareceu moderno e sempre um projeto de futuro. Manteve o gosto de novidade na mente dos seus leitores, mas não deixou que esse prazer se estabilizasse. À procura de novas formas, ultrapassou os limites convencionais, ora incursionando pelo espaço, explorado com a perspicácia do artista plástico (que ele se revela melhor nos diários, cuja publicação em série a Secretaria de Cultura iniciou no ano passado), ora singrando novos domínios do verbo, sangrado e descarnado para ser elíptico e direto, como num hai-kai. Poucos poetas exibem maestria tão ampla e diversificada como ele, hoje e em qualquer tempo.
Dois poemas demarcam essa trajetória mais do que qualquer juízo crítico. Em “Muaná da Beira do Rio”, que integra O Estranho, com seu acento amazonicamente drummondiano:

“A velha matriz branca
De palavras largas
Sozinha na praça
Olhando o rio sujo.

Montaria dançando. Tarde preguiçosa.
Rua quieta. Jornal do prefeito
Com santo na primeira página.

E a usina bufando, bufando,
Engolindo lenha.

Na janela do posto do Correio
Um cacho de banana balançando”.

E um trecho da “Travessia I (1926/1966)”, com significativa epígrafe de Guimarães Rosa (“Existe é homem humano. Travessia”), arrematando a simbiose do poeta com sua terra, expressa em sensualidade e carnalidade pela união das pessoas com os componentes físicos de sua vida, trecho que tive o privilégio de publicar pela primeira vez em 1971, na coluna diária que escrevia em A Província do Pará:

“E veio Amor, este amazonas
fibras febres
e mênstruo verde
este rio enorme, Paul de cobras
onde afinal boiei e enverdeci
amei
e apodreci”.

Esta é a mais amazônica das poesias, sem precisar de regionalismos, de expressões locais remetidas ao significado dicionarizado em nota de pé de página. E ainda assim (ou por ser exatamente assim), a mais universal poesia amazônica.
Aos 82 anos, Max Martins sofre os dissabores de doenças agravadas na velhice e minimizadas pelo apoio que tem recebido do Curro Velho, Casa da Linguagem, professores da Unama, equipe médica do hospital Porto Dias e Amarilis Tupiassu, aos quais a família manifesta seu reconhecimento. Mas é preciso que o governo do Pará, em nome de todos nós, providencie o que for necessário para dar uma vida confortável e digna àquele que, ainda em vida, pode ter sua importância reconhecida (e nós, a satisfação de sermos representados por um conterrâneo de tanto valor). Além de tudo, Max foi um servidor público impecável, tanto no governo federal quanto no estadual. Sua terra se dignificará ao prestar-lhe os serviços dos quais ele é merecedor.

Nenhum comentário: