Lúcio Flávio Pinto
Editor do Jornal Pessoal e articulista de O Estado do Tapajós
Quase nove meses depois da divulgação do fato neste jornal, a Folha de S. Paulo noticiou que um dispositivo enxertado fraudulentamente no Código Judiciário do Pará continua a ser aplicado como se fosse legal. A adulteração de um trecho do artigo 100 foi efetuada por ocasião da republicação, em 2003, da lei que instituiu o novo regulamento do poder judiciário estadual, datado de 1981. A republicação foi necessária porque o código foi parcialmente alterado depois. Mas no novo texto aprovado pela Assembléia Legislativa não constava a delegação de competência ao TJE para redefinir competências das varas judiciais através de resolução. Essa inovação foi incluída na edição do Diário da Justiça que republicou todo o texto. Ignorando a fraude, o tribunal mudou competências nos fóruns de Belém e Icoaraci.
Com a repercussão do assunto pela Folha, que é o jornal de maior tiragem do Brasil, o TJE abandonou a atitude anterior, de silêncio, e se manifestou. Contestou a matéria do jornal paulista se preocupando mais em sugerir a possibilidade de responsabilizá-lo e ao seu informante, em função da “grave acusação ao Poder Judiciário”, do que em esclarecer o conteúdo da notícia. É claro que, em tese, se houve a fraude, todos os processos instruídos pelas varas que tiveram suas competências alteradas com base na fictícia delegação de poderes poderiam ser anuladas. Mas é também óbvio que isso não ocorrerá, dados os tumultos processuais e prejuízos generalizados decorrentes. A falha poderá – e deverá – ser suprida e convalidada para evitar o caos. Através de um novo projeto de lei, por exemplo.
No entanto, independentemente do saneamento na esfera judicial em função do interesse coletivo, há um ponto a exigir elucidação: quem é o responsável pela fraude, se houve mesmo fraude, conforme atestou por certidão a secretaria da Assembléia Legislativa, a pedido dos então titulares de cartórios de Belém, que tiveram seus interesses prejudicados por atos da presidência anterior do tribunal, culminando com a estatização dos ofícios? A fraude constitui crime e merece, pelo menos, a instauração de inquérito – policial e administrativo – para apurá-la. Afinal, fantasma não pratica esse tipo de ato.
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