Segue o texto da parecer.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N.º 597.994/PA
RECORRENTE: MARIA DO CARMO MARTINS LIMA
RECORRIDO: JOSÉ ERASMO MAIA COSTA
RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL
RELATORA: MINISTRA ELLEN GRACIE
11. O recurso reúne condições de admissibilidade, devendo, pois, ser conhecido. Não comporta, todavia, provimento.
12. Discute-se a possibilidade de os membros do Ministério Público exercerem atividade político-partidária, após o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, sem o afastamento definitivo da instituição.
13. A tese defendida na ação de impugnação e acatada pelo Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que, tendo a candidata ingressado no Ministério Público após a Constituição de 1988 e tendo a mencionada Emenda Constitucional nº 45/2004 exigido o desligamento definitivo do órgão ministerial para o exercício da atividade político-partidária, faltar-lhe-ia uma das condições de elegibilidade, uma vez que apenas licenciada da instituição.
14. A ora recorrente, por sua vez, sustenta que ingressou no Ministério Público antes do advento da Emenda Constitucional nº 45/2004 e que se encontrava licenciada e eleita para um segundo mandato consecutivo quando houve a alteração constitucional, tendo, segundo entende, direito adquirido ao exercício da atividade político-partidária e à reeleição.
15. Esta não parece ser, contudo, a compreensão mais adequada do tema.
16. A possibilidade de os membros do Ministério Público exercerem atividade político-partidária constituía matéria controvertida mesmo antes da alteração trazida pela Emenda Constitucional nº 45/2004. O texto original do art. 128, § 5º, inciso II, alínea “e”, da Constituição Federal era assim redigido:
“Art. 128 – O Ministério Público abrange:
(...)
§ 5º – Leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros:
(...)
II – As seguintes vedações:
(...)
e) exercer atividade político-partidária, salvo exceções previstas em lei.”
(sem grifos no original)
18. Tais dispositivos foram objeto de ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas pelo então Procurador-Geral da República (ADIs nº 1.371 e nº 1.377), tendo esse Supremo Tribunal Federal, sob o entendimento de ser totalmente incompatível o exercício das funções ministeriais e a vinculação a partido político, julgado parcialmente procedentes as ações, para dar aos dispositivos interpretação conforme a Constituição, estabelecendo que a filiação de membro do Ministério Público somente poderia efetivar-se na hipótese de afastamento de suas funções institucionais, mediante licença, nos termos da lei.
19. Naquela oportunidade já vislumbrava-se a dificuldade de harmonização entre as funções institucionais dos membros do Ministério Público e o exercício de atividade político-partidária, como esclareceu em seu voto o ilustre Ministro Néri da Silveira:
“Difícil se faz, destarte, a harmonização de uma postura institucional de independência e imparcialidade com vínculos partidários de que decorrem deveres e disciplina impostos por entidade de direito privado aos que a ela filiados, de ordinário, em face também de conjunturas de cada momento político em que viva a sociedade.[1]”
21. Não obstante, reexaminado o tema, ressalta a conclusão de que, com a mudança trazida pela Emenda Constitucional nº 45/2004, fez-se absoluta a proibição da atividade política, assim dispondo a nova redação do art. 128, § 5º, inciso II, alínea “e”, da Constituição Federal:
“Art. 128 – O Ministério Público abrange:
(...)
§ 5º – Leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros:
(...)
II – As seguintes vedações:
(...)
e) exercer atividade político-partidária.”
(sem grifos no original)
23. Na lição de Alexandre de Moraes, “essa nova vedação passou a constituir causa absoluta de inelegibilidade – assim como já existente aos magistrados –, pois os membros do Ministério Público não poderão filiar-se a partidos políticos, nem tampouco disputar qualquer cargo eletivo, salvo se estiverem aposentados ou exonerados”[2].
24. As consequências da vedação trazida pela Emenda Constitucional nº 45/2004 foram anteriormente analisadas pelo Tribunal Superior Eleitoral em consultas que originaram as Resoluções TSE nº 22.045/2005 e nº 22.095/2005:
“COMPETÊNCIA – CONSULTA – REGÊNCIA E NATUREZA DA MATÉRIA. A teor do disposto no inciso XII do artigo 23 do Código Eleitoral, a competência do Tribunal Superior Eleitoral para responder consulta está ligada ao envolvimento de tema eleitoral, sendo desinfluente a regência, ou seja, se do próprio Código, de legislação esparsa ou da Constituição Federal.
MINISTÉRIO PÚBLICO – ATIVIDADE POLÍTICO-PARTIDÁRIA – ALÍNEA “e” DO INCISO II DO ARTIGO 128 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – EMENDA CONSTITUCIONAL nº 45/2004 – APLICAÇÃO NO TEMPO. A proibição do exercício de atividade político-partidária ao membro do Ministério Público tem aplicação imediata e linear, apanhando todos aqueles que o integram, pouco importando a data de ingresso.”
“CONSULTA. MATÉRIA ELEITORAL. DISCIPLINA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. CANDIDATURA. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. ADVENTO. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004. VEDAÇÃO.
I – Compete ao TSE responder às consultas que lhe forem feitas em tese, por autoridade federal ou entidade representativa de âmbito nacional, acerca de tema eleitoral '(...) do próprio Código, de legislação esparsa ou da Constituição Federal' (Precedente: Cta nº 1.153/DF, rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 26.8.2005).
II – Os membros do Ministério Público da União se submetem à vedação constitucional de filiação partidária, dispensados, porém, de cumprir o prazo de filiação fixado em lei ordinária, a exemplo dos magistrados, devendo satisfazer tal condição de elegibilidade até seis meses antes das eleições, de acordo com o art. 1º, inciso II, alínea j, da LC nº 64/90, sendo certo que o prazo de desincompatibilização dependerá do cargo para o qual o candidato concorrer.
(...)”.
(sem grifos no original)
26. A propósito, percuciente a argumentação do Ministro Joaquim Barbosa:
“ (...) os pressupostos de elegibilidade se renovam para cada eleição. Ela foi eleita em 2004 porque a situação jurídica dela, naquele momento, permitia. Essa situação se alterou em dezembro de 2004 e não atingiu o direito que ela adquiriu nas eleições de 2004. Ela pôde cumprir o mandato até o final; agora, tem de se submeter ao novo quadro jurídico trazido pela Emenda nº 45. Segundo esse novo quadro jurídico, ela não pode sequer candidatar-se”.
III
28. Ante o exposto, opina o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL pelo desprovimento do recurso extraordinário.
Brasília, 16 de abril de 2009
ROBERTO MONTEIRO GURGEL SANTOS
VICE-PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
ANTONIO FERNANDO BARROS E SILVA DE SOUZA
PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
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