Em 18 de setembro de 1982 meu artigo diário em O Liberal foi sobre as atribulações de um jornalista quando leva a sério o seu ofício, atraindo os raios dos poderosos (“ossos do ofício” era o título). Vali-me de uma frase de Millôr Fernandes: “jornalismo é oposição, o resto é armazém de secos & molhados”. No dia 8 de outubro Millôr me mandou, do Rio, um cartão manuscrito, no qual dizia: “não o conheço, mas porque me citou, seu artigo me chegou às mãos. Meus parabéns. Tem um tom raro de credibilidade. Você é assim mesmo ou está me tapeando? Se é assim mesmo meus mais profundos parabéns. Você se incorpora a não mais de meia dúzia de jornalistas deste país. Um grande abraço. Millôr”.
Na mesma semana em que um juiz de Belém me condena por me atribuir a prática de delito contra a honra, reencontrar a mensagem de Millôr me fez lembrar um episódio com Carlos Heitor Cony, antes de sua vida mudar de rumo a partir do aluguel da sua pena para Adolpho Bloch, até o aviltamento com a Bolsa Ditadura. Por causa dos seus heróicos artigos no Correio da Manhã, a parir de 1º de abril de 1964, Cony foi processado pela Lei de Segurança Nacional. O juiz do caso decidiu realizar a audiência de instrução do processo no gabinete do ministro da guerra (e futuro presidente da república), marechal Arthur da Costa e Silva, autor da ação, sem qualquer pudor.
No último artigo que escreveu para o jornal, anunciando o seu comparecimento à sessão, no terreno adverso, Cony arrolou os nomes das testemunhas de acusação, todas elas desconhecidos oficiais do Exército. E citou suas próprias testemunhas, dentre elas Alceu Amoroso Lima, Otto Maria Carpeaux, Carlos Drummond de Andrade e outros intelectuais desse porte. Arrematou a crônica com um “considero-me julgado”.
Entre Millôr Fernandes, o juiz Raimundo das Chagas e os Maiorana, a quem devo considerar o melhor avaliador do meu jornalismo?
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