terça-feira, 7 de julho de 2009

A saga dos nordestinos - 2ª parte

Hélcio Amaral de Sousa

A presença nordestina foi tão intensa, que, chegou a influir na cultura cabocla de Manaus; o sotaque nordestino prevaleceu e perdura até os dias de hoje.

A derrocada da borracha no mercado internacional foi tão violenta que bem poderia ser denominado de “genocídio econômico da Amazônia,” onde ricos empresários dormiram ricos e amanheceram pobres e os seringueiros miseráveis. A rica região passou a ser tratada apenas como potencialmente rica e os quase duzentos mil nordestinos que para cá tinham vindo enriquecer, formaram o maior contingente de miseráveis, situação que causou desespero também no seio das comunidades nordestinas, para onde eram remetidos os parcos haveres conseguidos na laboriosa atividade. Como os nordestinos, também ficaram os estrangeiros que aqui prestavam serviço aos exportadores e importadores estabelecidos na região. Os nordestinos, na grande maioria, não tiveram dinheiro nem mesmo para voltar à terra natal e por isto ficaram perambulando pelas comunidades rurais e urbanas solicitando trabalho que lhes assegurasse pelo menos a alimentação. Alguns ficaram ocupados na colheita e manejo do cacau que ainda abundava nas restingas da calha do Amazonas; cortando árvores nas margens do rio Amazonas para ser usada como combustível para os navios que eram movidos por caldeiras a lenha; outros foram ser vaqueiros nas fazendas pecuárias e os poucos que dispunham de algum dinheiro foram desenvolver atividade no comércio habilidade muito peculiar à raça.

Se fizermos uma pesquisa mais profunda, vamos concluir que em todas as cidades ficaram nordestinos remanescentes da atividade da extração da borracha.

A Cia. Ford Industrial do Brasil que se instalou no rio Tapajós, no lugar denominado FORDLANDIA, em 1927, ainda alistou grande número de nordestinos que mais uma vez, tangidos pelo espírito de aventura, lá compareceram para participar desse então empolgante projeto agrícola, onde plantaram em torno de dois milhões de seringueiras. Muitos desses operários eram remanescentes dos nordestinos que continuavam na Amazônia a procura de trabalho. Outro número bastante expressivo, foram os descendentes desses bravos retirantes que já tinham se integrado à sociedade amazônica.

SOLDADOS DA BORRACHA


Ao fim da terceira década do século XX, surgiu a segunda guerra mundial, tendo de um lado a Alemanha, Itália e o Jápão, chamados de grupo do Eixo e de outro lado: Inglaterra, Estados Unidos, França, Rússia e o Brasil que mais tarde veio aderir, denominados de Aliados.

Os centros de produção de borracha da Ásia, estavam sob o domínio do grupo do Eixo e os aliados logo viram a necessidade de uma estratégia para conseguir borracha, matéria prima importante para a manutenção da luta.O governo brasileiro formou um batalhão de nordestinos que alistados e fardados no nordeste, seguiram à Amazônia, desembarcando nos mais diversos afluentes do grande caldaloso, com a missão de retirar o precioso látex e que eram tão importantes quanto os que lá na frente de batalha empunhavam seus fuzis. As feras silvestres e a insalubridade da floresta equatorial vitimaram mais brasileiros do que as sangrentas batalhas na dura e gloriosa tomada do Monte Castelo, na Itália. Podemos formar duas estatísticas diferentes sobre a baixa dos soldados da borracha. Os que ficaram sepultados na floresta e os que abreviaram sua existência em conseqüência das moléstias adquiridas na longa permanência, na Amazônia.

Desta nova migração, ocasionada pelo recrutamento dos soldados da borracha, a Amazônia herdou um novo grupo de destemidos homens que passaram a integrar aos sensos demográficos amazônicos e que com seus numerosos descendentes formaram uma parcela apreciável de nossa progressiva Santarém.

O governo brasileiro reconheceu a importância da contribuição desses destemidos soldados da selva e criou lei especial de aposentadoria para ampará-los.

A permanência dos que não conseguiram voltar par o Nordeste, possibilitou a oportunidade da vinda de outros familiares, isto já em número bastante reduzido, mas, as prolongadas e flagelantes estiagens da década de 50 obrigou a migração de um contingente de elevado número de famílias onde mulheres e crianças constituía a maior parte. Santarém recebeu nesse período inúmeras famílias que se localizaram no planalto ao sul da cidade, em terras devolutas, ocupando área ao longo da BR-163 e posteriormente penetrando até à margem do rio Moju, onde fundaram a comunidade de “MOJUI DOS CAMPOS.” Mais tarde construíram outro ramal e denominaram de Estrada do Jaboti onde se estabeleceram inúmeras famílias. As terras da Br. 163 foram recusadas por não terem o líquido precioso que os obrigou a deixarem a terra natal.

Com a presença das famílias nordestinas no planalto, Santarém experimentou um período de progresso despontando como grande produtor de arroz de sequeiro e algodão, surgindo usinas de beneficiamento de arroz e de algodão. O algodão, após, descaroçado e prensado era exportado para o nordeste e para a Europa. O arroz abastecia as cidades do Baixo Amazonas, Manaus e as demais comunidades chegando ao distante Porto Velho e Acre. Os nordestinos descendentes, continuam ajudando Santarém a se desenvolver, dominando o lojismo, atividade que desempenham com grande desenvoltura.

Os mais novos voam mais alto, atuam como profissionais liberais nas mais diversas profissões, notadamente na área da saúde, do direito, do magistério, da engenharia e já ensaiam ocupar espaço na política partidária preenchendo cargos no legislativo e até no executivo.
Eu, como neto de nordestino de Santana do Acaraú, também sinto um orgulho cívico deste destemido povo.
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Leia a primeira parte aqui.


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