terça-feira, 25 de agosto de 2009

Lúcio Flávio Pinto: Grandes projetos 30 anos depois


Os grandes projetos econômicos abriram clareiras na floresta amazônica e nela instalaram o capitalismo mais moderno do mundo. Os primeiros desses empreendimentos entraram em operação há 30 anos, no Jari. Quem se lembra? O que acha?

Em 1976 o Projeto Jari encomendou um documentário de quase meia hora de duração a Jean Manzon. Era um momento delicado. Nove anos antes o bilionário americano Daniel Ludwig, do alto dos seus 70 anos, sucedera um grupo de empresários portugueses estabelecidos em Belém no controle da vasta área de terras que fora do coronel (da Guarda Nacional e de barranco) José Júlio de Andrade, imensamente poderoso até a revolução de 1930 (quando o tenente Magalhães Barata o tomaria por inimigo). A compra dos ativos da Jari Comércio e Industria custara a Ludwig três milhões de dólares.
Era o maior – e mais complicado – imóvel rural de que alguém poderia se tornar dono na Amazônia. Os detentores dos muitos papéis depositados em vários cartórios achavam que eles lhe davam direito a 3,6 milhões de hectares. Depois de apurar melhor as coisas através dos seus advogados, Ludwig se satisfaria com menos da metade, “apenas” 1,6 milhão de hectares.
Na foz do rio Amazonas, porta de entrada para uma nova fronteira de recursos naturais quase do tamanho dos Estados Unidos, a possessão de um dos homens mais ricos e estranhos do mundo incomodava e provocava reações diversas. Mesmo alguns setores militares, que sustentavam o governo, estabelecido através de golpe de estado em 1964, desconfiavam daquele grande projeto. Mais do que projeto, era um império, funcionando como se constituísse um autêntico país dentro do Brasil. Seria uma ponta-de-lança do governo americano?
Centenas de milhões de dólares estavam sendo investidos para criar duas cidades de porte razoável para o padrão regional e outras 10 menores, as silvivilas, para cuidar dos plantios, que se estenderiam por quase 100 mil hectares. Calculava-se que a população desse território com ares de autonomia logo passaria de 100 mil habitantes. O exército de máquinas pesadas e equipamentos, como nunca antes houvera na selva amazônica, abria quase 900 quilômetros de estradas por ano.
Os carros se abasteciam de combustível grátis e ilimitado. Havia hospital, médicos, remédios à vontade. Quatro pistas de pouso, sendo uma equivalente ao dos grandes aeroportos, tinham movimento diário. Uma empresa de navegação fazia linha para Belém e uma frota de aviões levava e trazia passageiros constantemente, vários deles estrangeiros. Uma ferrovia de 70 quilômetros ligava a fábrica às plantações.
Mais do que uma empreitada econômica, o “grande projeto” parecia materializar uma concepção de poder. Ameaçava criar um governo paralelo na Amazônia. Tocava nos nervos da “comunidade de segurança e informações”, a espinha dorsal do regime militar, que, com sua doutrina de segurança nacional, promovia a integração da Amazônia justamente para não entregá-la a estrangeiros. E não era exatamente isso o que estava acontecendo no império de Mr. Ludwig, ameaçando a soberania do Brasil sobre essa enorme possessão de terras?
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