segunda-feira, 29 de março de 2010

Belo Monte: Obra nem começou, mas já atrai migrantes e investimento para Altamira

Do G-1

Ainda não se sabe quem vai construir a hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu (Pará), mas a cidade de Altamira, que será a sede administrativa da obra, já começa a receber pessoas em busca de trabalho e investimentos de empresários locais. O leilão que definirá os construtores da obra está marcado para o próximo dia 20.

Segundo dados do Sistema Nacional de Emprego (Sine) - que funciona como uma agência pública de emprego -, as 8.266 pessoas que se cadastraram em Altamira de janeiro a 25 de março deste ano já equivalem a quase o dobro das 4.218 de todo o ano passado.

"Está bem claro que estão chegando pessoas vindas de fora, temos casos do Maranhão, do Rio de Janeiro, do Amapá, de Rondônia. Gente que já trabalhou em fábricas, em montagem de estrutura metálica. Percebemos claramente quem é daqui e quem vem de fora. Muita gente vem aqui e diz: 'Eu vim entregar meu currículo para trabalhar na barragem", conta a diretora do Sine em Altamira, Elcirene Silva de Souza.

Elcirene, que dirige o Sine em Altamira, destaca, no entanto, que a oferta de vagas não aumentou na mesma proporção da procura.

"Atendemos não só gente de outros estados, mas de Belém e outras cidades do Pará. Mas também é preciso verificar que isso tem um lado negativo. No ano passado, atendemos mais de 4 mil pessoas e só colocamos no mercado de trabalho 2 mil. Acredito que se não houver uma grande oferta de vagas, vamos ter problemas sociais maiores do que os benefícios da barragem."

Durante visita do G1 ao Sine de Altamira, a reportagem encontrou Welerson Aires, de 25 anos, que havia chegado de Vespasiano, Minas Gerais, duas semanas antes, atraído por Belo Monte. "No ano passado passei o carnaval aqui e alguns amigos me convidaram para morar na cidade. Agora, achei que era um bom momento para vir", contou.

Aires cursou um ano da faculdade de administração, mas parou o curso. Ele não pretender trabalhar na construção, mas avalia que o empreendimento vai trazer oportunidades para fornecedores. "Não tenho profissão certa, mas gostaria de encontrar algo na área administrativa."

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Foto: Mariana Oliveira / G1 Welerson, de Minas, chegou a Altamira há duas semanas (Foto: Mariana Oliveira / G1)

Jamil Massaru, que também se cadastrou no Sine de Altamira, tem um currículo de destaque, segundo a própria diretora da agência: trabalhou em uma empresa de máquinas no Japão nos últimos anos. Voltou ao Brasil há menos de seis meses e nesta semana resolveu se inscrever na agência.


"Voltei do Japão porque as coisas não estavam boas lá. Meu pai tem uma fazenda em Medicilândia (perto de Altamira), mas eu nem tinha pensado em procurar emprego por aqui. Quando soube da barragem resolvi me candidatar. Pode ser que alguma empresa japonesa atue na obra e queira alguém com experiência."

De acordo com o Sine de Altamira, a maioria dos currículos de pessoas de outros estados que chegou neste ano é de homens solteiros e com boa qualificação.

Investimentos

De olho no fluxo migratório para Altamira, empresários locais também já estão investindo na abertura de novos negócios e na expansão dos estabelecimentos.

O empresário Jorge Gonçalves, que também preside a associação comercial local, é dono de uma farmácia. No começo do ano, ele se mudou para um imóvel maior, com novas instalações, e ampliou seu quadro de funcionários de 12 para 16. "Ampliei para atender um maior número de pessoas com mais qualidade, de acordo com a necessidade que devemos ter em curto prazo", conta.

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Foto: Mariana Oliveira / G1 O empresário Jorge Gonçalves ampliou farmácia e está construindo apartamentos para alugar na parte de cima (Foto: Mariana Oliveira / G1)

Além de investir na farmácia, Jorge também está construindo cinco apartamentos na parte de cima da farmácia. São imóveis de apenas um quarto para atender possíveis funcionários ou fornecedores da obra. "Quero alugar tanto para escritório quanto para residência. A entrega será até o final de maio, que é quando a cidade já deve estar mais movimentada por causa da obra."

O empresário Daniel Nogueira, que até o ano passado trabalhava com distribuição de gás de cozinha, se juntou com o irmão Antoniel para concretizar os planos de construir um hotel.

"Já tínhamos plano de construir, mas a proximidade da barragem foi responsável pela decisão de investir", diz Daniel, que inaugurou o Amazon Xingu no fim do ano passado.

Foto: Mariana Oliveira / G1 Daniel e Antoniel Nogueira abriram hotel em Altamira, o Amazon Xingu (Foto: Mariana Oliveira / G1)

Daniel Nogueira considera que a hidrelétrica é um incentivo para o empresariado local. "Os empresários estavam desanimados. A discussão em torno da obra já é antiga, mas desta vez as pessoas creem que vai dar certo", diz.

Segundo o proprietário do hotel, o imóvel tem área para expansão, se necessário. "Já investimos alto agora, mas temos área para expandir se for preciso, Mas agora é preciso ter cautela, esperar como as coisas vão ficar", afirma Daniel, que diz se preocupar com o aumento da violência e com a falta de políticas públicas na região com o aumento populacional.

Migração

A secretária de Assistência Social de Altamira, Socorro do Carmo, afirma que algumas famílias já estão chegando à cidade e pedindo o auxílio da prefeitura.

"Até agora, o fluxo maior é de pessoas com recursos. Mas nossa expectativa é de que venham muitas famílias sem casa, sem nada. E não temos condições de receber essas pessoas agora. O objetivo é que a empresa vencedora do leilão se responsabilize", diz.

Para o procurador do Ministério Público Federal no Pará, Ubiratan Cazetta, nenhum dos municípios que abrigarão a hidrelétrica tem capacidade de atender, com políticas públicas, as pessoas que chegam. Ele afirma que isso é motivo de preocupação e que o tema será acompanhado pelos procuradores.

"O licenciamento [da hidrelétrica] fala em política pública para atender as cidades afetadas, mas não delimita de quem é a responsabilidade. A simples divulgação da licença já atrai público. O Ministério do Trabalho disse que não era dono da obra. Em tese o vencedor do leilão será o responsável. O fato é que o problema já está instalado."

Foto: Mariana Oliveira / G1Pedreiro trabalha em construção de apartamentos no centro de Altamira (Foto: Mariana Oliveira / G1)

De acordo com o governo federal, a empresa vencedora do leilão da hidrelétrica, marcado para o dia 20 de abril, vai ter arcar com os impactos sociais da obra nas cidades afetadas. O valor previsto em contrapartidas é de R$ 3 bilhões.

Obra

Além de Altamira, a hidrelétrica ocupará parte da área de outros quatro municípios: Anapu, Brasil Novo, Senador José Porfírio e Vitória do Xingu. Altamira é a mais desenvolvida e tem a maior população dentre essas cidades, com 98 mil habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os demais municípios têm entre 10 mil e 20 mil habitantes.

A região discute há mais de 30 anos a instalação da hidrelétrica no Rio Xingu, mas teve a certeza de que o início da obra se aproximava após a concessão em fevereiro, pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), da licença para início da construção. Há duas semanas, o governo marcou a data para o leilão.

Belo Monte será a segunda maior usina do Brasil, atrás apenas de Itaipu, e custará pelo menos R$ 19 bilhões, segundo o governo federal. Trata-se da segunda maior obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), uma das principais bandeiras do governo Lula.

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