O jornal venezuelano El Nacional respondeu ontem com um protesto, estampado na primeira página, à decisão judicial que proibiu a publicação de uma foto que retratava violência. No lugar destinado à imagem, ficou apenas um espaço em branco preenchido na diagonal pela palavra “censurado”, impressa em tinta vermelha. “Estamos sob censura. Isso é inconstitucional e atenta contra a liberdade de expressão”, protestou Miguel Henrique Otero, editor do jornal, falando a uma emissora de rádio de Caracas.
A ordem do tribunal, emitida na véspera, veta “imagens, informações e publicidade de qualquer tipo de conteúdo com sangue, armas, mensagens de terror, agressões físicas que aticem conteúdos de guerra e mensagens sobre mortes e assassinatos”. Dias antes, o El Nacional, duro crítico do governo de Hugo Chávez, tinha estampado na capa uma polêmica foto que mostrava inúmeros corpos no necrotério.
“Se aqui houvesse uma foto, vocês veriam um pai chorando por um filho que morreu”, diz a legenda de um dos espaços em branco publicados na edição de hoje. Outra sentença do mesmo tribunal estende a medida a todos os meios impressos do país, que ficam proibidos de publicar por um mês “imagens violentas, sangrentas, grotescas, acontecidas ou não, que de uma forma ou outra vulnerem a integridade psíquica e moral das crianças”.
“Estão promovendo a censura à imprensa”, protestou em sua manchete o jornal Tal Cual, que também publicou nesta semana a polêmica foto do necrotério de Caracas. Segundo Eleazar Díaz, diretor do Ultimas Noticias, a sentença é “absurda e sem sentido”. Em editorial, o diário afirma que “o Estado venezuelano dá motivos aos que o acusam de restringir a liberdade de informar”. Caracas registra em média 50 mortes violentas por fim de semana. Com 16 mil homicídios em 2009, a Venezuela foi o país com a maior taxa na América do Sul.
A falta de segurança está no centro da campanha para a crucial eleição legislativa de 26 de setembro, em que o bloco chavista está ameaçado de perder a maioria. O próprio presidente se referiu à polêmica foto dos corpos no necrotério da capital, e classificou a decisão de publicá-la como “manipulação politiqueira e pornográfica da violência e da criminalidade”. O professor de comunicação Marcelino Bisbal, da Universidade Católica Andrés Bello, lembra que os atritos entre o governo e a imprensa se sucedem nos últimos meses, mas alerta: “Nunca vimos uma atitude como essa”. Ele chama a atenção para viés eleitoral da censura: “Chama a atenção que a proibição dos conteúdos que tenham a ver com violência e insegurança tenha sido ditada por um mês, justamente quando estamos em campanha”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário