Lúcio Flávio Pinto
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O
Bradesco, na época o maior banco privado do Brasil (depois foi superado
pelo Itaú, dos Setubal; mas ainda é dos maiores do mundo) não podia
participar do leilão do controle acionário da Vale, em maio de 1997. O
Estatuto das Licitações, ainda em vigor, proibia que o avaliador
participasse, direta ou indiretamente, da licitação (em que modalidade
fosse: concorrência, tomada de preço, convite, ou leilão).
O Bradesco, integrou o consórcio de avaliação do acervo da Vale, sob a liderança de fato da Merril Lynch, sponsor broker
(agente) da Anglo American, na África do Sul. Por isso e também porque
detinha mais de 17% do capital da CSN, a Companhia Siderúrgica Nacional
(igualmente vendida. seis anos antes), nem o Bradesco nem a CSN
poderiam participar do leilão da Vale. A Lei 8.666/93 reputa ilegal
qualquer participação igual ou acima de 5% do capital,
Foi
montada uma “complexa engenharia financeira”, aprovada pelo BNDES, para
o Bradesco financiar debêntures conversíveis em ações da Vale, emitidas
pela Eletron e o Sweet River Fund (ambos de propriedade de
Daniel Dantas, do Opportunity), com prazo de um ano. Como tais
debêntures não foram resgatadas, o Bradesco pôde se apresentar como
acionista controlador da Vale.
Para
consolidar o arranjo, o Bradesco promoveu uma “cisão” do seu capital,
no primeiro trimestre de 2000, e constituiu a Bradespar, cujo capital
inicial foram as ações de controle do Bradesco na Light, na CSN e na
Vale. Conseguiu assim utilizar a participação na Vale como capital da
nova entidade (Bradespar), o que confirmaria a ilicitude da presença do
Bradesco no leilão de três anos antes.
Para
uma cisão regular ser admitida, é necessário, além da auditoria
contábil, uma auditoria jurídica, sob a responsabilidade de um
escritório de advocacia idôneo, sem compromissos com a empresa promotora
da cisão. Esse escritório, no caso Bradesco/Bradespar, foi o
Carvalhosa e Eizirik Advogados, que deveria responder a um questionário
elaborado pela promotora da cisão.
O
advogado Eloá Cruz, que patrocina numerosas ações populares contra a
desestatização da Vale, observa que, como o Bradesco nada indagou sobre a
influência do contencioso gerado pelas ações judiciais contra a
alienação da estatal, o escritório de advocacia podia alegar que não
esclareceu esse ponto.
Isto
porque não lhe perguntaram, nem o Bradesco e – mais grave –muito menos
a Comissão de Valores Mobiliários. Tanto as informações quanto as
omissões, contudo, podiam ser confirmadas por qualquer pessoa no balcão
da CVM, no Rio de Janeiro.
Além
das manobras jurídicas, um fato concreto indicava o papel desempenhado
pelo Bradesco na nova sociedade: a presença de Roger Agnelli, que fez
carreira na instituição, desde o posto mais humilde até o topo da
estrutura.
Além
de ocupar a presidência da Vale, Agnelli também era presidente do
Bradespar, o braço do Bradesco na mineradora; membro do Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), que assessora quem esteja no
cargo de Presidente da República do Brasil (fez sessões decorativas
diante de Lula e ainda não foi convocado uma única vez por Dilma);
membro do Conselho Internacional de Investimentos, que assessora o
Presidente da República da África do Sul, e intregrante do International Advisory Committee da New York Stock Exchange (NYSE), a Bolsa de Valores de Nova York.
A companhia estava, portanto, em mãos confiáveis. Continua, mais ou menos.
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