NOTA AO PÚBLICO
A 3ª Câmara Cível Isolada do Tribunal de Justiça do
Estado do Pará me impôs uma nova derrota na semana passada: rejeitou recurso
através do qual eu reivindicava o direito à ampla defesa na produção de provas
num dos processos que tramitam contra mim. A Constituição me assegura esse
direito. O tribunal quer me privar de exercê-lo.
O motivo seria novamente uma falha formal. Ao
preparar um recurso anterior (agravo de instrumento), eu deixara de juntar a
procuração dada pelos agravados ao seu advogado, peça considerada indispensável
para dar validade ao recurso.
Os agravados são os irmãos Romulo Maiorana Jr. e
Ronaldo Maiorana, que cobram nada menos do que 400 mil reais de indenização por
supostos danos materiais e morais que eu lhes teria causado (e à sua empresa,
Delta Publicidade, que edita O Liberal) com artigos publicados no meu Jornal
Pessoal.
De fato, não há cópia da procuração, a mesma falha
apontada na ação do grileiro Cecílio do Rego Almeida, que me obrigaria a
indenizá-lo. Mas desta vez há um documento nos autos: é a certidão fornecida
pelo diretor de secretaria da vara por onde o feito tramita. O nome dos
procuradores das partes é citado no documento, fornecido por um serventuário da
justiça que tem fé pública, responsável pelo cartório do ofício.
O primeiro agravo, de instrumento, foi proposto por
mim em 2008. A então relatora, desembargadora Maria Rita Xavier (já
aposentada), não me concedeu a liminar que solicitei, para a suspensão
temporária do processo até o julgamento de mérito do agravo. Mas recebeu o
recurso, intimou a parte agravada, determinou as providências de praxe e se
preparou para sentenciar.
Dois anos depois, a magistrada descobriu que
faltava a procuração. Sem se dar ao trabalho de citar a certidão ou opor-lhe
suas razões para exercer, pela segunda vez, passados dois anos, o juízo da
admissibilidade, rejeitou meu recurso. Sustentou ainda que meu pedido perdera o
objeto.
Essa decisão (assim como a retratação) foi repetida
pelo novo relator, desembargador Roberto Gonçalves de Moura, e acolhida por
seus pares na câmara, ao apreciar o segundo agravo (regimental).
O desembargador, o último a ser promovido ao TJE
por merecimento, recebeu o processo no dia 15 de março e o sentenciou um mês depois,
introduzindo-o extra-pauta para julgamento, como se houvesse pressa ou razão
superior para decidir um processo que permaneceu sem movimentação durante um
ano e meio.
Por enquanto faço este registro. Embora resumido, é
suficientemente longo para exigir um pouco de paciência e boa vontade do leitor
desta nota, enquanto me preparo para a reação devida e a nova batalha que se
avizinha. Com o ânimo decidido a enfrentá-la, sem me deixar intimidar, como das
outras vezes em que houve essa intenção mal disfarçada de decisão judicial. Em
nome da qual, quantas iniquidades se comete no Estado do Pará.
A NOVA
DECISÃO
A 3ª Câmara Cível Isolada do Tribunal de Justiça do
Estado do Pará, em sessão realizada no dia 26, publicada na edição eletrônica
do Diário da Justiça do dia seguinte, conheceu, mas negou provimento ao agravo
interno que interpus. A decisão foi unânime: os dois outros desembargadores que
integram a câmara acompanharam o voto do relator, Roberto Gonçalves de Moura,
recentemente promovido ao topo da carreira da magistratura estadual, e que
presidiu a sessão.
Meu recurso foi incluído para julgamento na sessão
como matéria extra-pauta. Ou seja, não estava originalmente pautado para essa
sessão. A precipitação do julgamento costuma ser feita quando se trata de
matéria de urgência. Acompanharam o voto do relator os desembargadores José
Maria Teixeira do Rosário e Helena Percila de Azevedo Dornelles.
No mesmo dia 27 o Diário da Justiça publicou o
acórdão (que tomou o número 107.217) do julgamento, mas com a data de 2 de
maio, o primeiro dia útil depois do fim de semana e do feriado. Embora
considerado publicado, não constava da edição eletrônica o inteiro teor do
acórdão, apenas a sua ementa (uma espécie de resumo), que diz:
“Agravo regimental. Fungibilidade recursal. Agravo
interno. Ausência de pressuposto de admissibilidade. Falta procuração dos
agravados. Retratação da decisão pelo juízo a quo. Ausência de qualquer
inovação. Agravo interno conhecido, porém à unanimidade, improvido”.
O processo, que estava com a juíza Elena Farag,
convocada para atuar até o dia 3 de março como desembargadora, por falta de
quorum na 3ª Vara Cível Isolada do TJE, foi distribuído para Roberto Moura, no
dia 6 de março e lhe foi concluso no dia 15. No dia 26 ele apresentou seu voto em
sessão.
Roberto Moura foi nomeado para o cargo de
desembargador em fevereiro. O ato da designação foi publicado na véspera de ele
receber o processo por redistribuição. Os autos ficaram com a juíza Elena
Farag por quase quatro meses, desde 11 de novembro do ano passado.
O processo foi sorteado inicialmente para o
desembargador Leonam Gondim Cruz Júnior, mas imediatamente ele se declarou
suspeito por motivo de foro íntimo. Com base no regime do TJE, pedi que ele
revelasse os motivos de foro íntimo em sessão secreta do Conselho da
Magistratura. Nunca recebi uma resposta ao meu requerimento.
A VELHA
HISTÓRIA
Esse capítulo da perseguição
judicial que sofro começou quando os irmãos Romulo
Maiorana Júnior e Ronaldo Maiorana propuseram ação de indenização contra mim,
em 2005. Isso foi logo depois que Ronaldo me agrediu diante de dezenas de
pessoas, no Parque da Residência, com a cobertura de dois policiais militares,
que atuam como seus seguranças particulares. Processado, Ronaldo fez acordo com
o Ministério Público do Estado, pagou multa (em cestas básicas para
instituições de caridade) e ficou livre. Eu passei a responder a 14 processos
que ele e o irmão ajuizaram contra mim.
Os Maioranas
queriam não só a reparação de danos morais, que alegaram haver sofrido em decorrência
de artigo do meu Jornal Pessoal, como danos materiais. Mas não provaram
tais danos materiais, nem sequer sugeriram quais fossem. Prová-los passou a ser
não só necessidade da defesa, como também etapa essencial do julgamento da
lide.
Como provar?
Simples. A empresa, também autora da ação junto com seus donos, disse que seus
prejuízos materiais exigem ressarcimento equivalente a 300 salários mínimos
(130 mil reais na época. R$ 200 mil hoje), apenas pelos prejuízos materiais
(mais valor igual por supostos danos morais). Esse dano – concreto e objetivo –
teria ocorrido entre 2004 e 2005, quando meu artigo jornalístico foi publicado.
Logo, a produção da
prova só podia ser obtida nas demonstrações financeiras da empresa. Por ser uma
sociedade anônima, a Delta teria que registrar os danos alegados nos seus
balanços dos dois exercícios financeiros e provisioná-los (ou ao menos
indicá-los). Por isso, pedi a juntada dos documentos.
Os Maioranas, como
sempre, se recusaram a fornecê-los. A recusa foi declarada de forma direta e
cabal diante do juiz Mairton Carneiro, em plena audiência de instrução, pelo
advogado do grupo Liberal, indiferente às penas do artigo 359 do Código de
Processo Civil, por desobediência.
Em relação à prova
requerida do balanço de 2005, os Maioranas ainda tinham a possibilidade de
atuar em juízo, mas em relação ao balanço de 2004 seus direitos de se opor à
divulgação já haviam decaído por completo. Tinham simplesmente que ser
obrigados a juntar as peças aos autos.
Se realmente houve
perda material causada pelo meu artigo, e se esse prejuízo foi tão expressivo
que exigiu reparação no valor de 200 mil reais, por que os Maioranas se
entrincheiraram na recusa à apresentação dos documentos nos quais estaria a
materialização da perda?
Óbvio: porque
perda não houve. Não só porque o texto não caracteriza qualquer forma de
ilícito, como porque a alegação de dano material foi mera elucubração de Romulo
e Ronaldo, para atender sua sanha de perseguição a mim.
PROVAR: PARA QUÊ?
Ambos se dispõem a
tudo, inclusive ao crime de desobediência à justiça, que foi caracterizado e
reconhecido pelo julgador, mas não se apresentam para a limpa e honesta
produção de provas, segundo o amplo processo contraditório, que é o núcleo da
tutela jurisdicional enquanto pilar do estado democrático de direito.
Embora autores de
14 ações sucessivas contra mim, paradoxalmente, mesmo como autores, sempre
obstruíram a instrução dos processos, não comparecendo sequer às audiências
marcadas pelos julgadores para produzir suas provas ou contraditar as da sua
vítima.
Como o mesmo quadro
já se ia configurando, para provocar a obstrução da instrução processual,
dispensei as minhas três testemunhas. Mas mantive o pedido de produção da prova
documental (“a rainha das provas”, como dizem os advogados), porque essencial
ao deslinde da controvérsia.
Sem essa prova, a
ação seria tudo, menos o reconhecimento da verdade e do direito. Seria, pelo
contrário, a violação à proteção constitucional conferida ao cidadão, à ampla
defesa e ao contraditório, no devido processo legal.
Suscitei a exceção
de suspeição da juíza, por não exigir a juntada dos documentos referidos,
dispensando dessa forma os Maioranas de provar a alegada materialidade do dano,
que poderá passar a ser presumido e vir a ser reconhecido em sentença.
Tive então que recorrer à instância
superior para que a prova indicativa e deferida fosse produzida. O recurso foi distribuído em
setembro de 2008 e recebido dois meses depois pela desembargadora Maria Rita
Lima Xavier, da 3ª Câmara Cível Isolada. Mas ela não concedeu o efeito
suspensivo que eu pedi. Intimou o outro lado a apresentar suas contrarrazões.
Em setembro de 2010 ela negou seguimento ao recurso. Tive que recorrer a outro
tipo de agravo, o regimental.
MAGISTRADOS
SUSPEITOS
Para poder instruir
o primeiro recurso, a desembargadora pediu informações ao juiz de origem do
processo, que primeiro o apreciou. O ofício foi endereçado primeiro ao então
presidente do feito no 1º grau, juiz Mairton Marques Carneiro. Mas ele não o
pode despachar porque acatou a exceção de suspeição que suscitei contra ele.
É que uma
fotografia do juiz tinha aparecido em O Liberal, registrando
festivamente seu aniversário e o elogiando. O material atestava a existência de
relação mais íntima entre o juiz e os autores da ação, donos do jornal. Colocar
personagens de interesse da “casa” em suas colunas sociais é uma das táticas da
empresa para cativar – digamos assim – amigos e influenciar pessoas.
Com a
redistribuição, o processo foi encaminhado à juíza Terezinha Nunes Moura,
titular da 3ª vara. Na sua ausência, João Batista Lopes do Nascimento, que a
substituía, ao invés de prestar as informações, se limitou a encaminhar cópia
xerox da decisão que a titular tomara. Terezinha deferiu as testemunhas por mim
indicadas, e que o juiz Mairton Carneiro rejeitara, de forma arbitrária e sem
fundamento legal.
Assim, entendeu a
relatora, o pedido fora atendido e a minha causa perdeu seu objeto. Mas não era
bem assim: o atendimento foi parcial – e não substantivamente.
JUSTIÇA DESRESPEITADA
No primeiro agravo,
requeri que o recurso fosse provido para, reformando-se a decisão agravada, as
testemunhas por mim indicadas fossem ouvidas e também fossem juntados os
documentos apontados.
Esses documentos
eram as demonstrações contábeis de Delta Publicidade, que edita o jornal O
Liberal, referentes aos exercícios de 2004 e 2005, com todos os documentos
que as acompanham. Elas eram indispensáveis para que eu pudesse me defender das
acusações que me foram feitas, “evitando-se o flagrante cerceamento ao direito
de defesa, em afronta à tutela constitucional que lhe é assegurada”, conforme
dito no recurso.
Quando a juíza da
3ª vara cível deferiu apenas as testemunhas, mas não os documentos apontados,
de imediato me insurgi. Escaldado por tantos episódios semelhantes, argui a
suspeição da nova julgadora e insisti pelo atendimento pleno do que já me fora
concedido em fase anterior da instrução processual em 1º grau.
PEQUENOS ERROS?
Sem atentar para a
essência da questão, a desembargadora-relatora se ateve a detalhes da
formalidade processual, o que se tornou uma regra de ouro nos procedimentos dos
magistrados nas ações em que os Maioranas e eu somos partes. Também nas de
outros meus perseguidores, como ocorreu com a ação de indenização de Cecílio do
Rego Almeida. Os julgadores apontam a falta de um documento qualquer para me
prejudicar ou punir, sem apreciar o conteúdo da questão (o seu mérito, no
jargão jurídico).
Disse a
desembargadora (já aposentada) Maria Rita: “Não bastasse a perda do objeto anunciada,
o presente recurso também não estaria apto a ser conhecido. É que após um
novo juízo de admissibilidade, constatei que o agravante não cumpriu
com o que determina o artigo 525, I, do CPC, isto é, não juntou cópia das
procurações dos agravantes” (o grifo é meu).
No entanto, o
primeiro documento anexo ao agravo de instrumento é uma certidão de intimação
expedida pelo diretor de secretaria do cartório do 6º ofício cível, Edmilton
Sampaio, datado da antevéspera da apresentação do recurso, com todos os dados
dos advogados, tanto os meus quanto os dos Maioranas. A certidão atestava
existência nos autos do instrumento de mandato outorgado pelos agravados e
agravantes, conforme as folhas citadas pelo dito diretor de secretaria.
Logo, estava
atendido o que pretende o artigo citado pela relatora, que é “a necessidade de
ficar comprovado documentalmente que o advogado que subscreve a peça é de fato
o procurador do agravante – aquele que supre a incapacidade postulatória deste
– e que o causídico que será intimado para responder ao recurso (arts. 524,
III, e 527, V) é, de fato, o procurador do agravado” (citação de Antônio
Cláudio da Costa Machado, no livro Código de Processo Civil Interpretado,
4ª edição, São Paulo, 2004, págs. 740/741).
É certo, como também observa o
mencionado tratadista, que a ausência de qualquer dos três documentos “fará com
que o relator indefira o processamento do recurso”. No entanto, a
certidão do diretor de secretaria do 6º ofício cível, fornecida a meu pedido,
era completa e atendia à exigência legal.
Ela atestava a existência dos dois
instrumentos de mandato das partes, não deixando qualquer dúvida sobre a
identidade dos seus procuradores e garantindo assim a segurança processual, que
é o objetivo da lei. Com as informações que contém, a certidão viabiliza a
intimação da parte contrária para a resposta. Já a procuração outorgada por mim
era garantia de que quem assina a petição era, de fato, meu representante
legal.
A apresentação da procuração no instrumento
objetiva que se garanta à parte agravada o direito de contra-arrazoar o
recurso. Essa finalidade foi cumprida. Assim, não se podia falar em prejuízo,
sendo certo mesmo que em nome do princípio da instrumentalidade das formas – de
acordo com o qual uma forma só existe e deve ser posta como estorvo à prática
de um direito caso sua violação (da forma) implique a violação de um direito de
outrem –, a exigência da procuração como peça obrigatória deve ter seu
rigorismo abrandado, quando as circunstâncias do caso demonstrem que a inobservância
da forma não prejudica o direito daquele em nome de quem se institui a forma
(neste caso, da parte agravada).
Assim julgou o Superior Tribunal
de Justiça, em ementa que apresentei no meu recurso:
“AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE
INSTRUMENTO. AUSÊNCIA DE PROCURAÇÃO OUTORGADA AO ADVOGADO SUBSCRITOR DAS
CONTRARRAZÕES AO RECURSO ESPECIAL. ART. 544, § 1º, DO CPC. PRINCÍPIO DA
INSTRUMENTALIDADE. CONTRATO BANCÁRIO. AÇÃO REVISIONAL. JUROS REMUNERATÓRIOS.
SÚMULA N. 7/STJ. APLICABILIDADE DO CDC. SÚMULA N. 284/STF. CAPITALIZAÇÃO MENSAL
DE JUROS. PACTUAÇÃO EXPRESSA. NECESSIDADE.
1. Desnecessária a juntada de cópia de todas as procurações outorgadas
pela parte agravada se regularmente intimada para contraminutar.
2. É inviável a aplicação da taxa de juros remuneratórios pactuada no
contrato na hipótese em que a Corte a quo tenha considerado cabalmente
demonstrada sua abusividade em relação à taxa média do mercado. Incidência da
Súmula n. 7 do STJ.
3. É insuscetível o exame, na via do recurso especial, de questão relacionada
à possibilidade de incidência de capitalização de juros em contrato bancário
se, para tanto, faz-se necessário o reexame do respectivo instrumento
contratual. Inteligência das Súmulas 5 e 7/STJ.
4. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no Ag 1304045/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA,
QUARTA TURMA, julgado em 19/08/2010, DJe 31/08/2010)”.
Além de reproduzir essa ementa, fiz referência à
jurisprudência do STJ, no mesmo sentido. Mas reproduzi por inteiro um julgado
contendo a ideia que guia o esvanecimento do rigorismo da regra processual
atinente à procuração como peça obrigatória:
“PROCESSUAL
CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRASLADO DE PEÇAS OBRIGATÓRIAS. ART. 544, § 1º,
DO CPC. AUSÊNCIA DE PROCURAÇÃO DO SIGNATÁRIO DAS CONTRA-RAZÕES DO RECURSO ESPECIAL.
EXCESSO DE FORMALISMO DESNECESSÁRIO NO PRESENTE CASO.
1. A jurisprudência do STJ afasta o conhecimento do Agravo de
Instrumento caso não se junte comprovação dos poderes outorgados ao signatário
das contra-razões do Recurso Especial.
2. Esse antigo entendimento busca resguardar o contraditório, ao
garantir que a parte agravada será regularmente cientificada dos atos
processuais posteriores.
3. Ocorre que essa jurisprudência pode causar graves injustiças à
agravante por conta de erro ou má-fé da parte contrária, que acaba por se
beneficiar do excesso de formalismo do Tribunal. É o caso presente (grifei).
4. As procurações que instruem o Agravo de Instrumento referem-se ao
advogado que acompanhou todo o processo e assinou as contrarrazões do presente
recurso. Peculiarmente, no caso das contrarrazões do Recurso Especial, embora
esteja registrado o nome desse mesmo advogado (cuja procuração consta do
instrumento), foi aposta apenas a assinatura de um segundo advogado.
5. Nem mesmo o agravado cogitou de nulidade do instrumento de Agravo por
conta desse vício. Suas contrarrazões no Agravo de Instrumento, assinadas pelo
advogado com procuração nos autos, ratificam suas contrarrazões no Recurso
Especial.
6. Ademais, o advogado sem procuração nos autos (que assinou as
contrarrazões do Recurso Especial) tem seu nome também na petição de
contrarrazões do Agravo de Instrumento, apesar de não assinar essa peça, o que
demonstra serem profissionais que atuam em conjunto.
7. Tudo isso demonstra a injustiça, nem sequer suscitada pelo agravado,
de não se conhecer do Recurso Especial por erro da parte adversa.
8. A jurisprudência do STJ deve ser mantida apenas nos casos em que há,
efetivamente, prejuízo, ainda que potencial, para a parte contrária, o que não
ocorre, in casu.
9. Agravo Regimental provido para que o Recurso Especial seja conhecido,
desde que preenchidos os demais requisitos.
(AgRg no Ag 1250545/PE,
Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/05/2010, DJe 21/06/2010)”.
O entendimento de José Roberto dos Santos
Bedaque (no livro Efetividade do processo e técnica processual. São
Paulo: Malheiros, 2006. p. 425) é exatamente este: “(...) a não-observância
daquelas exigências formais plenamente justificáveis pode tornar-se irrelevante
se não houver prejuízo ao fim visado pelo legislador.” A nota de rodapé nº
37, na mesma obra, referente a Pedro J. Bertolino, confirma essa
doutrina: “En efecto, el ‘exceso ritual’ implica un uso iregular de las
formas, en el sentido de no adecuación a la finalidad para la que se han
estabelecido. Esa iregularidad, lo há destacado reiteradamente la
jurisprudência, importa um daño para la Justicia. Ejercicio antifuncional u
daño configuran pues, a la par, el fenômeno ritualista. La adscripción
conceptual al abuso del derecho surge así, y a nuestro juicio, como basicamente
apropriada” (in: El Exceso Ritual Manifesto).
Tanto procedia
minha argumentação, que a desembargadora, em data 7 de novembro de 2008,
recebeu o recurso, sem suscitar a ausência do instrumento de procuração,
porquanto a certidão atendia em plenitude o dispositivo legal regulador do
juízo de admissibilidade.
Seu despacho não
deixava dúvida:
“Recebo o presente
recurso e reservo-me para apreciar o pedido de efeito suspensivo ativo
posteriormente, determinando ainda o seu processamento na forma da Legislação
Processual Civil em vigor”.
Como efeito de seu
entendimento, a relatora determinou três providências.
A primeira foi a
intimação, “na forma da lei”, do agravado, “para que, querendo, apresente as
contrarrazões ao recurso interposto no prazo legal (CPC, art. 527,V)”.
A segunda
providência foi o pedido de informações ao Juízo de origem, no prazo de 10
dias.
E, finalmente,
cumpridas as diligências, o retorno dos autos conclusos “para ulteriores de
direito”.
Logo em seguida, em
10 de dezembro do mesmo ano, a relatora deu andamento à instrução do feito,
solicitando informações do juízo. Uma semana depois, a resposta do juiz Mairton
Marques Carneiro foi recebida.
Em 14 de outubro de
2009 juntei procuração da minha nova defensora, em substituição ao meu advogado
anterior, que falecera. Eram filha e pai, funcionando no mesmo escritório de
advocacia. Tal procuração era desnecessária, já que o instrumento legal fora
juntado originalmente como anexo ao agravo, datado de 16 de setembro de 2007. A
duplicidade se explica pelas circunstâncias da morte do pai da advogada do
agravante, que dele era sobrinho, profissional que funcionava em várias outras
ações cíveis e penais do mesmo agravante.
LEMBRANÇA DEMORADA
Só em 13 de setembro
de 2010, quase dois anos depois de haver recebido e instruído o processo,
a relatora acrescentou, à perda de objeto da ação, a inexistência das
procurações dos agravados, que não apresentaram contrarrazões ao recurso. Logo,
a matéria estava vencida.
Em primeiro lugar
porque a certidão do diretor de secretaria do 3º ofício cível atendeu a todas
as exigências da lei. Mas também porque a matéria estava superada. O momento
processual da perquirição e contestação devidas quanto à falha formal já
passara.
A regra do art.
527, I, c/c o art. 557, caput, do CPC, é no sentido de que, distribuído
o agravo de instrumento no tribunal de apelo, o relator sorteado verificará a
existência dos pressupostos genéricos e específicos de admissibilidade do
recurso e, não havendo qualquer desses pressupostos, deverá negar-lhe
seguimento liminarmente.
De posse dos autos
do processo, a desembargadora-relatora não só os achou em condições de serem
recebidos como iniciou a instrução processual. Dentre as providências que
adotou, estava a citação do agravado, que considerou identificado e em
condições de ser informado da interposição do recurso para, querendo,
respondê-lo. A única deliberação que transferiu para depois do cumprimento das
diligências por ela determinadas foi “apreciar o pedido de efeito suspensivo
ativo”.
A doutrina dos processualistas
Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Neto (Código de Processo Civil
comentado e legislação extravagante. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2003, 7ª edição revista e ampliada), ao comentarem justamente o inciso I do
art. 527 do CPC, abona esse entendimento. Dizem os tratadistas:
“Conforme autoriza o CPC 557, o relator pode
indeferir liminarmente o agravo, bem como qualquer outro recurso, proferindo
juízo diferido de admissibilidade. Como o juízo definitivo de admissibilidade é
do órgão colegiado ad quem, da decisão do relator que indefere liminarmente o
recurso cabe outro agravo, em cinco dias, para o órgão colegiado competente,
para julgar o primeiro agravo (CPC 557 §1º). Somente se admitir o
recurso, proferindo juízo prévio e positivo de admissibilidade, é que o relator
tomará as providências previstas nos demais incisos da norma sob comentário” (grifo meu).
Ora, se a relatora procedeu a todos os atos
listados no artigo 527 era porque proferiu juízo prévio e positivo de
admissibilidade. Seu procedimento se enquadra perfeitamente na Teoria da
Vedação de Comportamento Contraditório, conhecida mais por seu nome latino,
venire contra factum proprium.
A norma se baseia na velha regra de direito privado
traduzida por outra expressão latina, o pacta sunt servanda. Há no venire
contra factum proprium dois comportamentos da mesma pessoa, lícitos em si e
diferidos no tempo. O primeiro – factum proprium – é, porém, contrariado
pelo segundo.
O venire contra factum proprium
caracteriza-se por situações em que uma pessoa, por um determinado período de
tempo, comporta-se de determinada maneira, gerando expectativas em outra de que
seu comportamento permanecerá inalterado.
Em vista desse comportamento, existe um
investimento, a confiança de que a conduta será a adotada anteriormente, mas,
depois de referido lapso temporal, é alterada por comportamento contrário ao
inicial, quebrando dessa forma a boa-fé objetiva (confiança).
Há, portanto, quatro elementos para a
caracterização do venire: comportamento, geração de expectativa,
investimento na expectativa gerada e comportamento contraditório. Todos esses
elementos estavam presentes na ação dos Maioranas contra mim. Logo, era totalmente incabível o argumento da relatora de
que não recebeu o recurso pela ausência de cópia das procurações dos agravados.
Mas esse argumento renasceu agora.
Para me atormentar a vida e, se possível, me impor nova condenação.
Como das outras vezes, porém,
reagirei.
BELÉM (PA), 1º de maio de 2012
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