Lúcio Flávio Pinto
O Sistema Integrado de Informações sobre Mortalidade do Ministério da
Saúde registra apenas três mortes causadas por “intervenções legais” no
Pará em 2014. Já no Anuário Brasileiro de Segurança Pública as mortes
computadas somam 159. O SIM contém a informação oficial. O anuário
utiliza dados coletados por meio da Lei de Acesso à Informação.
A discrepância pode ser verificada no Atlas da Violência 2016,
levantamento realizado pelo Ipea, o instituto de pesquisa vinculado à
Presidência da República. O levantamento, divulgado na semana passada,
indica que as mortes causadas por ação policial (eufemisticamente
abrigada no conceito de “intervenção legal”) continuam a ser omitidas
por algumas instituições.
Para o SIM, foram 681 as mortes por “intervenções legais” em 2014.
Para o anuário, a soma verdadeira é de 3.009 mortes causadas por ação
policial. A diferença entre as duas estatísticas é de 441,85%.
A polícia cada vez mais violenta e letal acompanha a gravíssima
situação do país. O número de mortes por homicídio foi de 59.627,
considerados os óbitos causados por agressão e ação policial. A taxa de
homicídios foi de 29,1 para cada 100 mil habitantes.
É o pior resultado da série histórica, medida pelo Ipea (Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada) em parceria com o FBSP (Fórum Brasileiro
de Segurança Pública) desde 2004.
O resultado coloca o Brasil com o maior número absoluto de homicídios
do mundo, levando em conta os dados do Observatório de Homicídios do
Instituto Igarapé de 2013. Considerando o ranking do Banco Mundial, que
inclui 154 nações, o Brasil ficaria entre as 12 com as maiores taxas de
homicídio.
Homens de 15 a 19 anos são as principais vítimas de homicídios. Nesse
grupo, mais da metade dos óbitos ocorrem por assassinato. As pessoas
com 20 a 24 anos, também do sexo masculino, são as mais visadas depois,
com 49%.
Para o Ipea, essa conjuntura prejudica “o processo de desenvolvimento
econômico e social”, já que os jovens respondem pela maior parte da
população economicamente ativa.
Agravando esse dado, há outra informação brutal: pessoas com 21 anos e
com menos de oito anos de estudo têm probabilidade 5,4 vezes maior do
que para quem tem a mesma idade com grau de instrução igual ou superior.
Quem não consegue chegar à universidade tem 15,9 vezes mais
probabilidade de ser assassinado.
Já os negros e pardos têm 147% a mais de chances de morrer vítimas de
homicídios na comparação com brancos, amarelos e indígenas.
Este é o retrato do Brasil que é esquecido, omitido ou distorcido
pela falta de atenção ao problema pela opinião pública nacional e,
sobretudo, pelas autoridades públicas.
É um lado do país cada vez mais doentio, ameaçando degenerar para uma
violência devastadora, independentemente dos seus rumos políticos e
econômicos. O monstro da violência adquiriu autonomia no Brasil.
Nenhum comentário:
Postar um comentário