terça-feira, 27 de maio de 2008

Ministra vai, ministro vem: e a Amazônia?

Lúcio Flávio Pinto
Editor do Jornal Pessoal e articulista de O Estado do Tapajós

Diz o ditado popular que só nos damos conta do valor de alguém quando o perdemos. No caso de Marina Silva, seria melhor dizer que só lhe damos valor ao verificar quem a substituirá no Ministério do Meio Ambiente. Assim como havia o general da praia, há o ecologista da praia - e Carlos Minc o personifica bem. Se Marina não tinha uma visão completa da Amazônia, sendo a Amazônia a prioridade do MMA, a de Minc é incomparavelmente mais distorcida. Não exatamente pela distância física, que pesa, mas pela idiossincrasia intelectual.
Marina é um produto típico da realidade amazônica enquistada no Acre, com um “viés” de matriz internacional, em função do culto de Chico Mendes lá fora. Mas Minc é a consolidação do exotismo que contamina e nega validade à visão de fora para dentro da região. O estereótipo e o maneirismo, além dos arranjos programáticos, passarão a vigorar de vez no Planalto no trato com a Amazônia.
Graças aos respaldos internacionais, Marina conseguiu abrigar e proteger uma equipe decididamente empenhada em evitar a escalada da devastação na Amazônia. Essa equipe sofria de macrocefalia, um mal danoso quando falta ao organismo braços para atuar diretamente na realidade. Boas idéias ficaram inconclusas ou irrealizadas. Sua execução jamais seria tranqüila num governo "desenvolvimentista", como o de Lula (nesse aspecto, como em várias outros, uma extensão do governo FHC, com outra retórica e um populismo mais conseqüente). Mas como a ministra decidiu engolir todos os sapos (sobretudo os barbudos) para continuar à frente do ministério e conduzindo a "causa", essa tolerância acabou desfigurando-a e imobilizando-a. O ato de maior efeito em todos os seus cinco anos foi o que tomou ao decidir sair, de natureza essencialmente política, fundamental para o seu futuro, que é político. Mas sem conseqüência para a Amazônia, agora sujeita às ordens de um ecologista de praia.
Dei esta resposta ao Elias Ribeiro Pinto, que me fez a pergunta sobre o que iria acontecer com o pedido de demissão de Marina no dia seguinte ao ato para publicar na sua coluna no Diário do Pará. Passados os dias, não sinto a necessidade de corrigir essa primeira impressão, que me veio tão logo soube da apresentação da carta da ex-ministra
Depois de perder várias quedas-de-braço, com competidores fora e dentro do governo, sendo humilhada em algumas ocasiões pelo presidente Lula, a última delas quando ele transferiu ao ministro sem pasta (e com muitos sonhos, ou delírios) Mangabeira Unger a condução do PAS (Programa Amazônia Sustentável), Marina deu o troco. Mais do que compensou, com essa tirada essencialmente política, que lhe reabre uma posição de respeito no Senado, tudo que precisou engolir até então. Uma vitória pessoal incontestável – e um lance de sagacidade de admirar. Deu o primeiro rabo de arraia no inatingível Lula.
O que isso representa para a Amazônia? Essencialmente, nada. Sabendo que há muita espuma num mar que pode não estar para peixe, Carlos Minc (até este domingo, 18, em que vos escrevo) resolveu, para usar expressão do setor, viajar na maionese. Se Marina calibrou para sair com honra de um cargo que a ameaçava enterrar, Minc soprou miríades de bolinhas de sabão para, se for o caso, não assumir com honra o ministério, voltando aos seus muitos afazeres praianos (e parisienses também, que ninguém é de ferro).
Mas se tudo for para fazer de conta, nada impedirá que Lula, depois de apreciar o jiló de sua velha aliada, também entre na dança e aceite tudo que o quase-futuro (mas-quem-sabe-talvez-ex) ministro exigiu, para, depois, acertarem o que vale de vera. Muito menos do que o que se diz para o distinto público.
O mundo virtual tudo aceita – e, ao que parece, o midiático também. A Amazônia real, aquela que também existe além da tela do computador, dos traços dos mapas e das linhas no papel, esta, ao que parece, continuará a ser destruída. Com mais jeito, provavelmente. Mas sempre.

Um comentário:

Anônimo disse...

Nos Amazonidas sabemos quanta realidade ha no seu texto.

Pena que os "ECOLOGISTAS PRAIANOS" so conheça a Amazonia da tela de computadores.

As vitmas somos nos Amazonidas.


Patricia. Novo Progresso, PA.