Adriana Lins
Repórter
A pesquisadora da Embrapa Amazônia Orienta, Gladys Beatriz Martinez, esteve em Santarém no final de semana para apresentar aos pecuaristas e produtores em geral o resultado de quatro anos de pesquisa para sua tese de doutorado pela Universidade Federal Rural da Amazônia, sobre " Estudos de espécies florestais e forrageiras de áreas de várzea do Baixo Amazonas - Pará para uso em sistemas silvipastoris". A pesquisadora conhece bem a cultura e realidade regional, pois trabalhou em Santarém no período de 1996 a 2004 chefiando a unidade da Embrapa no município e durante esse tempo precisou administrar muitos conflitos envolvendo criadores de gado e agricultores instalados em comunidades próximas ao Cacoal Grande, onde a Embrapa possui uma estação experimental.
Os agricultores reclamavam que o gado (bovino e bubalino) causava sérios prejuízos nos meses de plantio, quando invadiam as plantações. A saída na época foi sugerir a construção de cercas para isolar o rebanho a regiões específicas de pastagens. O problema consistia no fato de que em muitas áreas de várzea o pasto é escasso e não há uma cultura do produtor da várzea construir cercas por um período sazonal.
Gladys Martinez que sempre declarou sua paixão por búfalos, animais que sempre eram apontados como causadores dos maiores estragos na pastagem, acabou buscando respostas para tais conflitos, que segundo sua observação era provocado pela falta de pastagem. Durante sua apresentação aos produtores no SIRSAN, como ilustração sobre os efeitos da globalização, a pesquisadora demonstrou que nos últimos 10 anos a Amazônia teve as maiores enchentes e também as maiores secas, segundo dados da Agência Nacional das Águas - ANA, resultado do aquecimento global que provoca o degelo nos Andes.
Segundo Gladys a globalização atinge a região mesmo sem qualquer participação do homem regional. Um ponto que chegou a chocar os participantes da palestra foi quando a pesquisadora enfatizou que no modelo de mercado globalizado já não há espaço para a postura do criador "de que a natureza cria o gado".
Para Gladys Martinez "a produção pecuária requer investimentos". E ai é que entra o resultado de sua pesquisa. Ela aponta o sistema silvipastoris, que significa árvores introduzidas no pasto, como solução para o problema. "O ecossistema da várzea é altamente específico e seu uso deve estar baseado fundamentalmente no manejo ecológico relacionado ao processo social. A agricultura seguida da pecuária causou a redução da cobertura arbórea alterando as características desse ecossistema. As populações tradicionais exploram boa parte dos recursos naturais das matas ciliares onde o extrativismo se apresenta estratégico para sua sustentabilidade. Com as várzeas desmatadas, essas populações se vêem desabastecidas de importantes fontes de alimento e de outros usos" .
No entendimento da pesquisadora "recuperar esse ecossistema através introdução de árvores (sistemas silvipastoris) representa, não somente uma alternativa sustentável, mas um desafio cultural devido às tradições regionais, uma forte herança de antigas práticas. Neste sentido, o entendimento sobre a percepção humana das populações locais é fundamental para o planejamento e implementação de práticas sustentáveis".
Famílias de 13 comunidades rurais de várzea foram visitadas durante a pesquisa com objetivo de resgatar o conhecimento tradicional de recursos genéticos florestais e seus usos. O diagnóstico feito pela pesquisadora registrou 21 espécies de árvores de diversos usos, destacando-se as espécies frutíferas e madeiráveis, abundantes na região. Martinez identificou também as variedades das gramíneas coloninha (Brachiaria mutica biotipo 1), mojuí (Brachiaria mutica biotipo 2) e mori (Paspalum fasciculatum), como tendo um bom desempenho na recuperação dos pastos e aptas para compor sistemas silvipastoris de áreas sujeitas ao alagamento.
Como antingamente
Como antingamente
Durante sua palestra para os produtores no SIRSAN a pesquisadora demonstrou a trajetória do uso da várzea na região do Baixo Amazonas. As populações tradicionais ribeirinhas que viviam do extrativismo e da pesca e que praticavam a agricultura vendiam o excedente da produção e transformam numa poupança: compravam cabeças de gado para criar, que podiam ser bovinos ou bubalinos, dependendo da localização da propriedade. Aos poucos o rebanho desses pequenos criadores foi aumentando, bem como a família crescendo e continuando a desenvolver atividades semelhantes. No entanto, essa era uma espécie de atividade ainda "doméstica".
O que o ocorreu que muitos desses filhos de famílias ribeirinhas saíram da várzea e buscaram a cidade onde prosperaram e também buscaram o mesmo espaço de seus pais, começando a investir na criação de gado como "poupança". O que se assistiu a partir de então foi o crescimento do rebanho que pasta na área de várzea sem contudo, haver qualquer investimento na terra, como o preparo do solo e plantio de gramíneas capazes de resistir a enchente e produzindo alimento para o gado.
Desta forma, os conflitos entre moradores de algumas regiões tiveram início a ponto do Ministério Público ter que intermediar acordos entre comunitários há alguns anos atrás. Mas alguns criadores não aceitaram a tese defendida pesquisadora porque acreditam que fazem parte dessa "criação doméstica" e não se enquadrando portanto, na visão de serem investidores de fora da área de várzea.
A pesquisadora acredita que se o pecuarista entender o mundo globalizado não admite mais perdas ambientais. O setor agropecuário tem que ficar atento a isso, pois d a forma como são conduzidos os investimentos no setor há um grande risco de ser perdermos o que é nosso.
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