quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Multimistura santarena garante gerações saudáveis

Cilícia Ferreira
Repórter

A pedagoga santarena Tatiane da Silva(foto ao lado) é uma prova viva para desbancar toda e qualquer dúvida sobre a eficácia da multimistura como complemento alimentar no combate à desnutrição infantil, contestada pelo Conselho Federal de Nutrição. Tatiane foi uma das crianças que recebeu assistência da creche SEARA, há aproximadamente 20 anos.

Atualmente, Tatiane trabalha como professora na própria creche e em uma escola particular. Passou pela SEARA em três fases da vida: quando criança, até os 5 anos. Dessa fase, ela conta que não tem muita lembrança. Depois Tatiane foi para o programa chamado 'ajudante mirim', que capacitava pré- adolescentes para ajudar os professores na creche. Tatiane diz que, no início de cada ano, os 'mirins' passavam uma semana no centro educacional, em forma de internato para aprender a lidar com todas as áreas da creche( na cozinha, na sala de aula, aprendiam a trabalhar em grupo).

Após a capacitação, os 'mirins' iam para a creche como voluntários. Tatiane conta que, no início, foi uma iniciativa da mãe que a levou para ser voluntária na SEARA. Mas admite que as atividades foram lhe envolvendo e ela começou a gostar do que fazia. Ainda como mirim, entre 14 e 15 anos, Tatiane ganhou uma bolsa para trabalhar meio período como aprendiz na Gráfica Tiagão. Ela passou um ano na gráfica e depois que saiu se desvinculou da creche por quase 6 anos. Em 2004, Tatiane voltou à cheche como voluntária aos 21 anos e depois de três meses foi efetivada com professora da cheche. Ela está lá desde então. Tatiane conta que já recebeu várias propostas, financeiramente melhores, para sair da SEARA, mas diz que tem uma missão a cumprir com a SEARA. "Algo me diz que não é para eu sair, tenho uma missão", comenta.

Atualmente, Tatiane é pedagoga. Está com 26 anos, casada e grávida do seu primeiro filho. Leva uma vida normal. Sem as seqüelas que a desnutrição, quando não tratada a tempo, pode causar na fase adulta. Tudo graças ao trabalho pioneiro da médica Clara Brandão, fundadora da SEARA, em utilizar a multimistura como complementação alimentar de crianças desnutridas.

A Multimistura surgiu a partir de estudos sobre preparações alimentares regionais para o combate a desnutrição alimentar. Em 1975, a Dra Clara Brandão, especializada em Pediatria e, posteriormente, em Nutrição, iniciou, em Santarém, seus estudos a fim de descobrir uma ação para combater a desnutrição infantil. Com o progresso dos estudos, em 1979, e com a parceria do Projeto Casulo, da LBA (Legião Brasileira de Assistência), criou-se, a Sociedade de Estudos e Aproveitamento dos Recursos da Amazônia, a ONG SEARA, que visava atender crianças desnutridas, com educação e complementação alimentar, utilizando-se da multimistura.

A multimistura foi introduzida na alimentação das crianças em creches e, em quatro meses, percebeu-se os efeitos favoráveis da multimistura, as crianças começavam a se recuperar. Com os resultados positivos o trabalho foi continuado com a SEARA, mesmo depois da extinção da LBA.

Rosilda Waughan, membro do Conselho Fiscal da SEARA e que por muitos anos esteve à frente dos trabalhos da associação, recebeu à reportagem e apresentou toda a estrutura física, educacional e administrativa do local.

A multimistura é um princípio básico de nutrição. Atualmente, a SEARA disponibiliza a multimistura em forma de um pó verde. É um complemento alimentar natural, rico em vitaminas e minerais, composto de farelo, pó de folhas verdes escuras, pó de sementes. Das misturas desses componentes se obtém um pó que é utilizado diretamente nas refeições, ou em sucos, batidas de frutas, ou da forma que a pessoa quiser. Dona Rosilda ressalta que o pó só não pode ser cozido, para que não perca seu valor nutricional. "O ideal é colocar a multimistura logo depois da preparação dos alimentos, na hora de servir", explica.

Dona Rosilda ressalta que a multimistura não pode ser vista como 'milagre', mas como uma maneira de suprir o organismo das deficiências de nutrientes, desde que, usada da forma correta, "não como substituição, mas como complementação alimentar".

Ao longo da visita, dona Rosilda mostrou a cozinha e como são manipulados e preparados os alimentos. Como exemplo, a cozinheira, mostrou uma bandeja enorme repleta de folhas verdes (escuras), dentre elas estava a Taioba, planta comumente vista nos quintais, e que estava sendo acrescentada na preparação do almoço do dia. O detalhe que a cozinheira enfatizou foi que a taioba não pode ser consumida crua, tem que passar por, pelo menos, de 50 minutos de cozimento.

No refeitório, onde as crianças se divertem comendo, há uma organização impecável. Crianças entre 1 a 5 anos aprendem a valorizar o momento, assim como os componentes da refeição.
Dona Rosilda, conta que as crianças que não têm o hábito de comer verduras em casa, resistem nos primeiros dias, mas que ao longo dos meses, "vão absorvendo a ideia de comer verduras".

Ana Carolina Pereira, coordenadora do Centro Cultural João de Barro (creche SEARA) conta que o trabalho da creche, funciona com o objetivo de tirar as crianças da desnutrição. São 140 crianças atendidas vindas de 10 bairros: Uruará, Área Verde, São José Operário, Santana, Prainha, Livramento, Jutaí, Diamantino, Mararu e Centro.

As crianças atendidas têm entre 1 e 5 anos e ficam no centro por um período de 3 anos, no máximo, até saírem do quadro de desnutrição. Além disso, ela conta que a instituição visa trabalhar a educação alimentar de toda a família, de uma forma saudável e barata.
"Nós tentamos mostrar para cada mãe que é possível comer bem com pouco dinheiro, através do aproveitamento completo do alimento regional", explica.

Conheça a multimistura

A multimistura é vendida em porções de 200 gramas a um preço de R$ 3,00 e pode durar 20 dias, se consumido nas refeições diárias. O uso de 1 colher em cada refeição é suficiente para a reposição dos nutrientes.
Dona Rosilda(na foto, no centro) dá ênfase à utilização da macaxeira por completo. O uso das raízes, mais consumida popularmente e, sobretudo, das folhas que são riquíssimas em vitamina A e Ferro. Em comparativo com a alface, por exemplo, a folha de macaxeira
(mandioca) possui 1960 mg contra 87 mg da alface de vitamina A; e de ferro a folha de macaxeira possui 7,6 mg contra 1,3 da alface.
Esse complemento promove o crescimento (dentro e fora do útero); aumenta a resistências às infecções; previne e cura anemias nutricionais; diminui as diarréias, diminui as doenças respiratórias e mantém a saúde.

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