Lúcio Flávio Pinto:
O juiz substituto da 3ª vara da justiça federal em Belém, Pedro Maradei Neto, condenou o jornalista Carlos Mendes a dois anos de detenção por ter colocado no ar a Rádio Tabajara FM, em 2008. Sem ter autorização “das autoridades competentes” para funcionar, a emissora foi considerada clandestina e retirada do ar pela Anatel em agosto de 2010. A partir daí, Mendes, o único responsável pela rádio, foi processado na justiça pelo Ministério Público Federal.
Na sua sentença, datada de 26 de março, o juiz converteu a pena de detenção de dois anos, em regime aberto, e multa de 10 dias-multa, calculada sobre o salário mínimo, que era o mínimo legal pela prática do delito, em prestação de serviço à comunidade em hospital público e pagamento de duas cestas básicas, cada uma no valor de um salário mínimo.
Carlos Mendes, de 65 anos, um dos mais antigos jornalistas em atividade no Pará, sendo atualmente repórter especial do Diário do Pará e correspondente em Belém de O Estado de S. Paulo, anunciou que irá recorrer da decisão para a instância superior, o Tribunal Regional Federal da 1ª região.
Em uma nota, ele lembrou que a sua rádio foi fechada “depois que o Partido dos Trabalhadores (PT) fez duas tentativas de censurar e calar a emissora, ambas na Justiça Eleitoral, sofrendo derrotas, uma delas por unanimidade”.
O jornalista liga os dois fatos porque a operação foi realizada pela agência reguladora das telecomunicações, a Anatel, no início da manhã de um sábado, no dia 21 de agosto, com a cobertura de agentes da Polícia Federal. Nessa ocasião. a Tabajara denunciava um contrato assinado pela governadora Ana Júlia Carepa, do PT, com a Construtora Delta, para a locação de 450 veículos para a segurança pública do Pará. A Delta foi envolvida depois num escândalo nacional desencadeado por Carlinhos Cachoeira.
No depoimento que prestou na ação judicial, Mendes reconheceu que colocou no ar a sua rádio sem autorização legal, mas ressalvou que em 2009, quando a rádio ainda não tinha um ano de funcionamento, requereu a outorga da concessão ao Ministério das Comunicações. O processo tramita até hoje sem uma definição.
Nesse período, várias outras emissoras começaram a funcionar no Pará. O jornalista cita como exemplo as múltiplas (seriam 30) concessões obtidas pelo deputado federal Vladimir Costa, que caracterizariam o critério político desses atos.
A rádio Tabajara funcionava num estúdio precário nos fundos da residência da família de Carlos Mendes. Seu alcance não ia além de 10 quilômetros, em frequência modulada. Mas se destacou desde o início por seu conteúdo informativo e sua postura crítica, o que lhe valeu o crescimento da audiência e a hostilidade dos criticados.
A falta da outorga pelo governo federal foi seu calcanhar de Aquiles, de que se valeu a própria Anac ou algum denunciante influente, cujo nome – se comprovado o fato, negado pelas fontes oficiais – foi mantido em sigilo. A rádio foi retirada do ar, mas Mendes criou como alternativa a internet para continuar a se comunicar com seus ouvintes e leitores. “Esse, felizmente, ainda é um canal livre”, observa ele.
O juiz Pedro Maradei Neto se valeu, para a sua sentença, na denúncia do MPF e nos laudos da Anac. As informações produzidas pelos órgãos do governo, autor da iniciativa, o levaram à conclusão de que “a instalação de uma rádio clandestina de fabricação caseira acarreta, em primeiro lugar, risco à própria vida dos operadores, porque uma descarga elétrica pode matar os operadores, pois os aparelhos não têm a menor segurança.
Além disso, operar uma rádio exige controle da parte do Estado, sob o ponto de vista ético e dos bons costumes, relativamente à qualidade das notícias transmitidas e à responsabilidade penal dos autores de crimes praticados por via radiofônica”.
Como admite um antigo brocardo latino, a lei é dura para quem não conta com os seus favores. Carlos Mendes, a julgar pela observação do julgador, está nesse caso. Os jornalistas críticos, quase sempre.
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