domingo, 13 de julho de 2008

Código Judiciário do Pará foi adulterado

Lúcio Flávio Pinto
Editor do Jornal Pessoal e articulista de O Estado do Tapajós

Em 10 de dezembro de 1981 o Diário Oficial publicou a lei complementar que dispôs sobre o Código Judiciário do Pará. Em 15 de setembro de 2003 a lei foi republicada no DO, para incorporar as modificações ocorridas posteriormente. As alterações, porém, não alcançaram o artigo 100, que atravessou as mudanças incólume. O caput do artigo estabelecia que na comarca de Belém “haverá 30 juízes de direito, dos quais, 24 funcionarão nas seguintes varas”, relacionando-as em seguida. Só que na republicação de 2003, feita durante o governo Simão Jatene, foi acrescido uma frase: “cujas competências serão estabelecidas através de Resolução do Tribunal de Justiça”.
Os cartorários Cristóvão Jaques Barata e Carlos Alberto da Trindade só descobriram essa fraude quando começaram a preparar um mandado de segurança contra o Tribunal de Justiça do Estado, que, baseado justamente nos poderes criados por esse complemento ilegal, alterou as competências das varas às quais estavam vinculados no fórum cível da capital. Os cartórios, que lidavam com matéria comercial e patrimonial, teriam que se especializar nas questões de família, boa parte delas através da justiça gratuita. Praticamente perderiam sua renda, em conseqüência da oficialização da serventia.
Os dois cartorários reagiram ao ato, alegando que ele ignorava direito líquido e certo, previsto pela própria constituição de 1988, porque anterior à estatização. Mas, com ênfase, apontaram a usurpação dos poderes do legislativo pelo judiciário, graças ao ardil montado por quem fez o enxerto em relação ao texto original, fraude constatada e certificada pela secretaria da Assembléia Legislativa. As razões foram suficientes para o pleno do tribunal voltar atrás e, por 11 a 4, conceder o mandado de segurança. Mas a vitória temporária dos dois cartorários não pode encerrar a questão: quem adulterou o texto do Código Judiciário do Estado? Esta resposta quem tem que dar é a polícia, para a qual deve ser transferida a competência sobre a matéria.
Também há uma tarefa para a justiça paraense: se a lei não autorizou o tribunal a estabelecer as competências das varas através de resolução, a modificação promovida não tem valor legal. Os processos deixaram de tramitar perante o juízo natural, tornando-se suscetíveis de nulidade plena. São milhares de causas que estão tramitando temerariamente. Se a nulidade for suscitada, os problemas desabarão como uma catástrofe sobre todos e acabarão num destino único: a justiça do Pará. O pleno já reformou a primeira decisão. Falta agora dar-lhe um efeito geral, para corrigir o risco que perdura.

Fiscalização caça-níquel

Apenas os veículos com placas cujo licenciamento venceu em junho foram parados na barreira montada pelos órgãos estaduais de trânsito na rodovia Everaldo Martins que liga a cidade à vila de Alter do Chão.
Quer dizer: os caras queriam apenas multar os carros com documentação desatualizada. Os demais motoristas passavam sem ser incomodados.
Sem contar que não havia bafômetro para fazer o teste de dosagem alcoólica.

Em causa própria

O jornalista e ex-governador Hélio Gueiros escreve em sua coluna dominical no Diário do Pará uma nota desaprovando a lei seca no trânsito.
Como Hélio ficou conhecido pelo apelido de 'papudinho' por causa dos públicos gorós que tomava todos os dias, nada há de se estranhar de seu posicionamento editorial.
Se fosse ao contrário, os leitores - mesmo os porres - poderiam estranhar.

Incra dá aval a invasor para devastar florestas

Paulo Leandro Leal

O Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) Serra Azul, criado em 2005 pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em Monte Alegre, no oeste do Pará, está sendo alvo de invasões e desmatamento ilegal. Desde que o assentamento foi interditado pela Justiça Federal, no ano passado, os verdadeiros beneficiados pela criação do PDS não podem entrar na área, mas o Incra não fiscaliza a entrada de pessoas estranhas, não evita a devastação e o licenciamento do assentamento não acontece. Irritados e cansados de esperarem pelo governo, os assentados perderam a paciência e devem entrar em seus lotes este ano.
A interdição do PDS Serra Azul foi decretada pela Justiça Federal a pedido do Ministério Público Federal, que acusa o Incra de criar assentamentos de forma ilegal no oeste do Pará, sem o devido processo de licenciamento ambiental. Desde então, o Incra se comprometeu junto ao Ministério Público a providenciar as ações necessárias ao licenciamento, que deve ser feito pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema). Enquanto isso, as mais de 400 famílias que estavam na Relação de Beneficiários (RB) do Incra e deveriam ganhar um lote de terra no local ficaram impedidas de entrar na área.
O presidente da Associação de Assentados da Serra Azul (ASA), Luís Paulo, diz que a associação realizou um trabalho de conscientização para que as famílias não entrassem na área antes da legalização do PDS. 'Nós fizemos um trabalho muito grande, convencendo as pessoas a esperarem o licenciamento ambiental para ocuparem os seus lotes, mas o PDS está sofrendo invasões e está havendo desmatamento. Nosso temor é que estas famílias que querem trabalhar dentro da legalidade percam seus lotes para aproveitadores', diz Luís Paulo, reclamando da demora do Incra, da Sema e do MPF em resolver o problema. 'Os procuradores da República nem recebem a gente', desabafa.
Luís Paulo disse que devido à falta de uma solução e diante do quadro de invasões, as famílias que estão na Relação de Beneficiários devem entrar no PDS nas próximas semanas e ocuparem os seus lotes. 'Estas famílias estão tão preocupadas em trabalhar dentro da legalidade que muitos não queriam ocupar seus lotes agora, mas teremos que fazer isso para que a área não seja totalmente invadida', diz, informando que alguns assentados já vivem no PDS com as suas famílias. No total, cerca de 45 famílias já estão dentro do assentamento, que fica há mais de 100 quilômetros da cidade de Monte Alegre.
O agricultor Divino Amaral de Jesus não quis esperar que a burocracia legalizasse o assentamento e já mora no local, com a sua família. Ele demonstra preocupação com as ocupações ilegais, de pessoas que não estão na lista de beneficiários e começam a formar pastagens no PDS, para a criação de gado.
Mil hectares de floresta ameaçados
A demora do governo para licenciar o PDS Serra Azul pode gerar um prejuízo econômico e ambiental grave para toda a região. Os assentados que se cansaram de esperar pelo governo e vão ocupar os seus lotes terão que derrubar parte da floresta para plantar pelo menos o que comer. Cada assentado tem direito a desmatar até três hectares por ano, até o limite legal de 20 hectares, que correspondem aos 20% de desmate permitido por lei, em caso de lotes de 100 hectares.
O agricultor precisa de uma autorização do órgão ambiental para o desmate, mas os assentados dizem que não podem esperar mais pelo governo e que vão fazer a derrubada. Segundo Luís Paulo, cada assentado vai respeitar o limite de três hectares, mas é preciso fazer a conversão florestal para a prática da agricultura. 'Estamos tentando de todas as formas a legalização, mas não podemos mais esperar, temos que comer e o que sabemos fazer é isso. Não comemos pau, mas arroz, feijão, milho', diz o assentado João Xavier.
Se os assentados ocuparem mesmo o PDS e derrubarem o que têm direito, pelo menos 1,5 mil hectares de floresta amazônica devem ser queimados. É que como o assentamento não possui a licença ambiental, os colonos não poderão usar esta floresta derrubada de forma econômica, não poderão vender a madeira retirada. Paulo Silva garante que os agricultores não venderão a madeira de forma ilegal, sem autorização da Sema, e que tudo deve ser mesmo queimado. 'Nosso negócio não é madeira, é a terra. A Sema acha que não teremos coragem de queimar estes recursos, mas é isso que vai acontecer', lamenta.
O presidente da Associação explica que o ideal é que a Sema concedesse a licença ambiental do assentamento e liberasse os créditos da madeira retirada nas áreas de desmate. 'Ai sim, nós iriamos procurar uma empresa séria para vender estes recursos, pois seria uma importante fonte de renda para os assentados', explica, informando que seriam mais de 40 mil metros cúbicos de madeira. 'Mas tem que ser tudo dentro da legalidade, sem esta autorização vamos derrubar e queimar, porque as pessoas precisam de plantar para comer', garante.
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Monte Alegre (STTR), Sebastião Mota Magalhães, lamenta que a situação tenha chegado a tal ponto. Ele explica que cada assentado vai trabalhar em uma área de 20 hectares, pois a reserva legal dos lotes será em bloco. Assim, o assentado não tem como derrubar mais do que o permitido em lei, pois a reserva legal de sua área está localizada em outro local, formando uma grande área protegida.
'Estamos obedecendo todas as regras, como trabalhar apenas com 20 hectares e manter a reserva leal em bloco. Queremos preservar, ser um modelo de desenvolvimento sustentável, ter renda com a floresta em pé', diz o presidente do STTR. Sebastião explica que as famílias que vão ocupar o PDS são trabalhadores rurais, selecionados pelo Incra, pelo sindicato e pela associação criada para gerir o assentamento e que só depende do governo para que o PDS se torne mesmo um marco no processo de reforma agrária na Amazônia. (P. L.L.)
Legalização depende de promotor
Uma fonte da Sema, próxima ao secretário Valmir Ortega, informou que as licenças para os assentamentos rurais embargados pela Justiça não estão sendo expedidas porque o Ministério Público Federal não autorizou. No mês passado a secretaria assinou junto com o Incra um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que permitiria a legalização dos assentamentos, mas o documento não tem validade. 'O MPF não validou o TAC, porque não acredita mais no Incra', diz a fonte da Sema, pedindo para não ter seu nome revelado.
O Incra deveria realizar uma série de estudos de viabilidade sócio-econômica e ambiental nos assentamentos para dar entrada no pedido de licenciamento. Segundo o chefe da Unidade do Incra em Monte Alegre, Cleomar Luís Rodrigues da Silva, os técnicos do órgão estiveram no local e realizaram vários estudos, inclusive análise do solo para identificarem o potencial agrícola do assentamento. Ele diz que o órgão não poder dar seqüência à implantação do PDS por causa da interdição do mesmo e acredita que a Sema deva conceder, em breve, a Licença Prévia.
O MPF, por sua vez, não fala mais no assunto. Na Procuradoria da República em Santarém, os procuradores não recebem mais as lideranças da região para tratar sobre o problema dos assentamentos. Os integrantes da Associação dos Assentados da Serra Azul (ASA) já tentaram falar com os procuradores, mas não conseguiram. Eles querem pedir que uma solução o mais rápido possível para o PDS, pois temem uma invasão geral ao projeto. 'Temos notícia da instalação de uma mineradora na região e isso pode desencadear a vida de muita gente e conflitos por terra, por isso o assentamento tem que ser legalizado', diz Luís Paulo.
Além disso, o PDS não possui estradas, muito menos escolas, postos de saúde ou qualquer outro tipo de estrutura básica. Quem se aventura a ocupar os lotes têm que andar quilômetros a pé para conseguir chegar à cidade. As famílias que ocupam a área vivem em condições precárias, sem nenhuma assistência do governo. O chefe do Incra em Monte Alegre reconhece o problema e diz que o órgão possui apenas 10 servidores na unidade, que deveria ter pelo menos 70 funcionários. Ele resume as condições de vida destas famílias. 'Para chegar lá agora, só se for de helicóptero', admite Cleomar. (P. L. L.)

Relatório afirma, sem provas, que grupos "manipulam" mídia

Na Folha de São Paulo:

O relatório final da Operação Satiagraha, assinado pelo delegado da Polícia Federal Protógenes Pinheiro de Queiroz, diz que os supostos grupos criminosos do banqueiro Daniel Valente Dantas e do investidor Naji Robert Nahas "manipulam" a mídia. As supostas conversas, parte da atividade dos jornalistas, são o único "indício" apontado por Queiroz.
O relatório diz também que Roberto D'Ávila, da "TVE Brasil", recebeu R$ 50 mil em 2007 de Nahas. D'Ávila disse ontem à Folha que a remuneração se deve a trabalho feito pela sua empresa, a CDN, uma pesquisa de opinião sobre a imagem de Nahas na mídia.
"Até que gostaria, mas nunca entrevistei Nahas ou Dantas no meu programa", disse D"Ávila, que não foi ouvido pelo delegado. Ao citar outros jornalistas, Queiroz errou dois nomes. E não ouviu nenhum jornalista, antes ou depois do relatório.
O documento se refere à jornalista da Folha Andréa Michael como "integrante da organização criminosa", "travestida de correspondente da [sic] jornal Folha de São Paulo na cidade de Brasília". Michael foi autora de reportagem, em abril, que antecipou, com exclusividade, a operação da PF. O delegado ficou contrariado com a revelação e registrou isso no relatório. Pediu também a prisão temporária de Michael e busca e apreensão em sua casa, ambos negados pelo juiz.
Em nota, o jornal disse que "a Folha de S.Paulo repele insinuações de que o comportamento da repórter Andréa Michael não tenha sido correto. A repórter apurou fatos de notório interesse público relatados em texto publicado pela Folha em abril". A nota dizia ainda que "tentativas de envolver a profissional da Folha no inquérito só podem ser entendidas como esforço inútil de intimidar a equipe de reportagem do jornal e retaliar quem cumpriu com sua obrigação". Michael é repórter da Sucursal da Folha em Brasília há oito anos.
O delegado escreve ainda que as revistas "IstoÉ Dinheiro" e "Veja" estão "a serviço do grupo de Dantas." Cita os colunistas Diogo Mainardi e Lauro Jardim. Este teria feito uma reportagem -"Rumo à Supertele"- considerada "favorável" a investigados. Procurado pela Folha, Mainardi comentou: "É uma citação bisonha, uma patetice que infelizmente pode colaborar para que quadrilheiros escapem". Jardim afirmou: "A reportagem citada é jornalisticamente impecável".
O delegado citou ainda Leonardo Attuch, editor da "IstoÉ Dinheiro" e colunista da "IstoÉ", que teria feito "artigos jornalísticos "encomendados'". Attuch disse, por e-mail: "É mais uma tentativa de intimidação. Como jornalista, tenho direito de entrevistar o presidente ou um presidiário, sem preconceito. Sou alvo de leviandades da PF desde 2004".
Queiroz diz que jornalistas falam "quase diariamente" com Nahas com a intenção de "reunir-se com o maior número de formadores de opinião para "dar a sua versão da história'". O investidor teria "contatado" Vera Brandimarte, do "Valor Econômico", Paulo Andreoli, Thomas Traumann, da "Época" -chamado pelo delegado equivocadamente de "Talman"-, Elvira Lobato e Guilherme Barros (chamado de "Bastos"), da Folha, e João Saad, da "TV Bandeirantes".
Elvira viaja à China e não pôde ser ouvida. Barros disse estar surpreso com a citação, pois só teve um encontro com Nahas em sua carreira, "para tratar de assuntos estritamente jornalísticos e devidamente informados à Folha".
Brandimarte disse que nunca falou ou esteve com Nahas. Disse ser "nada mais do que natural" que seu nome esteja na relação de profissionais de negócios, pois dirige a redação de um dos principais jornais econômicos do país. Traumann disse que "nunca" falou com Nahas e que a menção a seu nome é "estúpida".