domingo, 17 de abril de 2011

Ficha não caiu


Lúcio Flávio Pinto

Apesar das críticas feitas à decisão do STF, que transferiu a vigência da lei da ficha limpa, o Brasil deu mais um passo para se livrar dos maus pretendentes a cargos elegíveis. O que falta agora é não deixar que eles fiquem impunes. Para isso, a justiça precisa funcionar.

Na sua já obsessiva – e pouco produtiva – campanha contra Jader Barbalho, O Liberal abriu manchete na capa da sua edição do dia 26 com uma provocação: “Lei da Ficha Limpa é potoca?”. Debaixo de um subtítulo (“Além de não punir os fichas sujas, dificilmente valerá para as eleições de 2012”), o texto explicava: “Ex-governador Magalhães Barata dizia que lei é potoca. A Lei da Ficha Limpa caminha nessa direção, pois já se admite que ela dificilmente deverá valer para as eleições de 2012. Os debates e julgamento de recursos poderão levar até dez anos, uma vez que a Constituição assegura ‘que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória’”.

O simples resumo é suficiente apenas para introduzir o leitor em matérias extremamente complexas do mundo do direito e da justiça. Elas não cabem, porém, na simplicidade arbitrária da frase, nem a figura do caudilho é boa inspiração para abordar a questão. Barata não chegou à conclusão de que lei é potoca depois de se desiludir por tentar aplicá-la: ele partia dessa presunção. Com seu espírito autoritário, voluntarioso e refratário às críticas, o líder do PSD (Partido Social Democrático) se recusava a se submeter às leis, quando elas contrariavam seus interesses (e, sobretudo, os apetites dos seus amigos e protegidos, cuja influência maléfica ultrapassava as limitações do chefe).

O Liberal, como se sabe muito bem, era dos poucos bens patrimoniais de Barata, que o recebeu por doação de amigos cotizados para comprar o jornal. Duas décadas depois de fundado, como órgão oficial do “baratismo” e arauto do caudilho, o jornal foi adquirido por Romulo Maiorana, casado com uma sobrinha do homem que foi o mais poderoso do Pará durante três décadas. Poder que se projetou sobre um vasto universo de personagens, desse rol fazendo parte o próprio RM. Chegado a Belém em 1953, Romulo ainda se beneficiou do último – e mais intenso – governo de Barata (entre 1956 e 1959, quando morreu de câncer antes do final do seu mandato).

A lei da ficha limpa está bem longe de poder se enquadrar na patacoada “baratista”. Uma centena e meia de políticos deixaram de disputar as eleições do ano passado por causa dela. Não é um número inexpressivo. Ela entrará em vigor em 2012, qualquer que venha a ser o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal a respeito dela. O que poderá acontecer é que sua vigência continue a ser parcial ou bastante limitada. Mas ela não foi – e é pouco provável que venha a ser – revogada. É uma conquista consolidada do povo brasileiro.

Numa visão primária, como a que teve O Liberal, por sua filiação originária a uma das vertentes viciosas dos hábitos públicos no Pará, a lei foi desvirtuada pelos julgadores, que não aceitaram reconhecer sua aplicação já em 2010. O acerto espúrio teria culminado com o voto do mais novo ministro do STF, que desempatou em 6 a 5, pondo fim a um impasse de quase seis meses. Com isso, reabrindo as portas para figuras já proscritas da vida pública pelo crivo moral da lei, como Jader Barbalho. Mais um acerto da politicalha brasileira, mancomunada com magistrados que traem seu dever de ofício?

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